quarta-feira, maio 28, 2008

Rubor.



- Lembras-te de olhar para mim e dizeres que estava todo encarnado?

- Lembro.

- Não estava cansado, estava com vergonha do tamanho da felicidade que sentia por te ver assim, nua.

Fotografia: Helmut Newton

terça-feira, maio 20, 2008

Chiroptera.



- Sabes o que é amorcegado?

- Não.

- É triste, taciturno, cabisbaixo, tristonho, sombrio...

- Pára! Pelo nome, pensei que era uma espécie de cegueira de amor.

- E é. Se reparares, é tudo sintomas disso.

Fotografia: Helmut Newton

quinta-feira, maio 15, 2008

Nascimento.



A primeira coisa a fazer, assim que se nasce, é chorar. Com ajuda de alguém ou sozinhos, quanto mais forte o fizermos, melhor será.

Não deixa de ser irónico ser esse o sinal de que estamos prontos e em conformidade.

Serve para afirmar a disposição e preparação para o que vier. O que for de extremos, dali para a frente, terá aquela marca.

Foi o princípio que calhou e não foi por acaso: há de ter muito uso se os anos correrem como se sabe.

Fotografia: Helmut Newton.

terça-feira, maio 13, 2008

História e vida: versão curta.

Rand Abdel-Qader, uma estudante iraquiana de dezassete anos apaixonou-se por Paul, um soldado inglês de vinte e dois. Aconteceu quando ela prestava apoio como voluntária a famílias desalojadas pela guerra.

Diz uma amiga que a coisa durou quatro semanas. Conversavam apenas e não aconteceu nada, tal era o respeito, o ardor ou a seriedade do evento.

O pai descobriu e matou-a com a ajuda de outros dois filhos.

Segundo a amiga, morreu virgem. Foi enterrada sem nenhuma espécie de cerimónia.

Versão longa aqui.

sexta-feira, maio 09, 2008

Nada.



Dava com ela a pensar no filho e nos filmes que se lembrava. Uma ilação sobrepunha-se: as fitas que corriam bem no princípio e no meio acabavam sempre mal. As que arregaçavam o drama no começo vinham a revelar-se com o tempo e encerravam bem.

O filho era novo, até agora a história dos dois era perfeita, se fosse um filme era mau presságio.

Mas os filmes são o que são e ela sempre foi tudo menos uma diva. Restava-lhe esperar e impor uma normalidade fora do comum. Uma tão grande que não prestasse para ser contada de qualquer forma.
Fotografia: Thierry Le Gouès