terça-feira, maio 31, 2005

Viste-a?


- Sim, vinha linda como de costume. Com um casaco branco com risquinhas cor de rosa.

- Olhou para ti?

- Não. Ou melhor, olhou de certeza, para garantir que não voltava a olhar.

- E tu, olhaste?

- Claro e morri mais um bocado. Também reparei no vinco lindíssimo que aparece na testa quando se impressiona com o que lê.

Tudo se despede de mim.




Podemos despedirmo-nos do que nunca nos pertenceu? Podemos perder a esperança de voltar a ser o que nunca chegámos?

Dou comigo demasiadas vezes a perguntar o que és realmente para mim. Tu e o resto que testemunha os meus passos e angústias suaves. Daquelas que já estão no bolso quando visto o casaco para sair. Sou eu próprio vezes demais.

Nunca me despedirei de ti. Não quero viver a pensar que perdi a única coisa que não podia.

Fotografia: Herb Ritts

segunda-feira, maio 30, 2005

Deus está nos pormenores.


“One day you’ll see, details will make all the diference”

Sem perceber se é a realidade ou não, penso muitas vezes nesta ideia do Fernando Pessoa: “tudo o que está à volta do Amor é muito mais bonito do que o próprio Amor”.

Tivesses tu a coragem para falar agora ou calar-me para sempre.




- E hoje? Ela vai dizer-te alguma coisa?

- Como queres que eu saiba?

- Como queres que eu te pergunte?

- Como queres que eu viva?

- Segunda-feira, não é verdade? Estás chateado?

- Agora começo a ficar.

- Com tantas perguntas?

- Já estou.

Fotografia: Helmut Newton.

Agora é de vez:


O novo endereço de mail do Estranho Amor é: dr.estranhoamor@gmail.com

O “dr.” não tem nada a ver com estudos ou pedantaria, mas sim com o nome original da obra que inspirou o deste blog.

quinta-feira, maio 26, 2005

Assim como assim.




- Então e ela, mesmo depois de tudo o que já lhe mostraste, ainda não te disse nada?

- Nada. Sabes como é, as mulheres demasiado interessantes são assim. Inseguras e com a certeza de que se um homem está demasiado apaixonado é porque é mau sinal.

- Nunca tinha pensado nisso dessa forma. És capaz de ter razão, se calhar dá-lhe vontade de rir.

- Se calhar.

- Mas é injusto.

- Mas é assim.

Fotografia: Helmut Newton.

É só escrever.


O Estranho Amor tem um novo endereço de e-mail: estranho.amor@hotmail.com

Na altura era este o endereço, mas actualmente é: dr.estranhoamor@gmail.com, Janeiro de 2013.

quarta-feira, maio 25, 2005

Foges de quê?


De palavras, de sonhos, de delírios? Porquê? Nunca foste amada como mereces? Tens que ir viver nos livros as partes mais importantes doutros romances? Daqueles que se internam noutras bocas?

A vida que me ultra passa.




Percorremos o mesmo caminho como estranhos. A horas desacertadas, sozinhos como os últimos pássaros de Outono. De certeza que pisamos as mesmas ervas e algumas das mesmas pedras. Era capaz de dizer que, às vezes, ainda vês o resto da nuvem que me tapou o Sol e o consolo.

Passam assim os dias a fugir sem saber de quê. Espreitas curiosa uma alma que se atropela e que nem conversa sabe meter. Não te preocupes, eu já aprendi a esperar.

Pelo menos conduz devagar se faz favor. O teu carro e o meu desespero.

Fotografia: Helmut Newton.

Magnitude.




Lembro-te que para além das flores, dos sorrisos, das lágrimas, dos poemas e dos sonhos existem os nossos corpos. Não perguntes se estão antes ou depois, digo-te que os prefiro juntos. Às vezes até penso que estão para além de nós próprios.

E se um dia te conhecer, serão eles a fazer as honras da loucura. Sem pedir licença, no frenesim que nos leva da realidade. Serão cavalos selvagens ou caldeiras descontroladas. Descarrilados e torcidos com as forças que dizimam.

Fotografia: Helmut Newton.

segunda-feira, maio 23, 2005

Não sei se eras tu,


mas se eras, então cortaste o cabelo, com a mesma tesoura que me corta agora a respiração.

Ou então não, e são só os dias e o juízo que me parecem cada vez mais curtos.

Nuance.




Vim ver-te. Pelo meio do fumo das chaminés, da calçada encardida, do Sol que se vai demasiado cedo, de algumas nuvens cinzas e da antipatia usada pela idade.

Ainda assim, arredo essa cortina de demasiada realidade e vasculho o Tejo, o reflexo do teu cabelo na minha boca e o sopro do vento nas canas.

De todos, escolho o teu cabelo na minha boca, por causa dos abraços demasiado apertados. Lembro-o com as mesmas saudades que me vão extinguindo.

Love will tear us apart.




Fez este mês 25 anos que Ian Curtis desistiu de nos aturar. Chamam-lhe poeta ou génio mas a minha designação preferida é romântico pessimista.

Gosto muito da cena de Manchester, os Joy Division, os New Order e o Peter Saville.

Às vezes tenho dificuldade em deixar o século passado. Eu e grande parte da cultura contemporânea.

sexta-feira, maio 20, 2005

- Achas que estou bem assim?


- Estás deslumbrante. Os meus sonhos sempre se vestiram de preto e branco.

Jóias mentirosas.




Sei que vens aqui mas finges que não me conheces. Para ti estas palavras são uma espécie de diamantes falsos. Correm a tua vida como se não existissem, como se fossem do melhor livro que não chegaste a ler. Perdes tempo com elas como as crianças que juntam pratas de chocolate nos livros.

Esperas por mais como quem espera por uma graça melhor que a de ontem.

E eu sou um vendedor barato que acredita, cego, naquilo que ama.

quinta-feira, maio 19, 2005

Porque lês uma revista de moda,


quando és tu a máxima?

Não estou cá.


Ando por aí contigo, com o brilho de todas as constelações nos olhos. A esconder o sangue que me ferve de alegria na cara.

Amor Perfeito.




Vivo nos arredores de ser feliz. Por ti e pela beleza que me cora as recordações de infância. Todas as histórias de Amor se resumem nos teus passos. Sentas-te longe ou sou eu que nem aqui estou?

És

Perfeita
adjectivo
Que não tem defeito físico nem moral; completa; modelar; exemplar; bela; formosa; impecável; total; cabal; magistral.

quarta-feira, maio 18, 2005

Os hífenes , os hífenes, malvados sejam.


Fosse eu escritor em vez de director de arte, e saberia usar o Word com o corrector ortográfico automático desligado.

Vi-te.


Estavas a ler o livro azul. Um dia ainda me contas que sonhos te trazem os dragões. Que inveja tenho das letras que olhas sem parar.
Estas palavras são para ti. Desculpa-me a ousadia.



Nada sei de ti. Não sei se leste as palavras que te deixei ao vento ou se rasgaste irritada a inocência que ainda não perdi. Não sei se mudaste a rotina de lugar ou se alguma vez espreitaste o que ainda resta da minha vontade de te falar. É provável que fujas da bravura inofensiva que me escalda as mãos. Talvez nunca saibas da pena que quase sinto por não saber o teu nome ou a tua rua.

Ainda assim, todas as manhãs o meu perfume é o mesmo.

A cobardia é uma trela que nos prende à regularidade dos dias medíocres.

terça-feira, maio 17, 2005

Escreve-me.


Como se fossemos os nossos pais separados pela guerra que não ganharam.

Escreve-me.

Lembro-me de ti. Sem saber como nem porquê. Como se precisasse de alguma razão.




E de sentir o estômago às voltas por nunca ter beijado e por imaginar que a rapariga que amava podia, caso fosse eu o mais afortunado dos homens, ser a primeira. Lembro-me de a ver e de sentir o céu a desabar sem aviso. De olhar e sentir que precisava de um movimento de restabelecimento sísmico.

De treinar deixas e falas para a abordar, repetidas até ficar com a língua e alma doridas. Lembro-me de ver fugir toda a minha vida na sua boca. De ser o mais competente e inexperiente amante do mundo.

Foi ontem.

A melhor música de Amor de todos os tempos de hoje:




Love’s Theme de Barry White. Esta só dá para quem está feliz. Grande instrumental. Para ouvir cinco vezes seguidas no mínimo.

Porquê Estranho Amor?




Que melhor altura do que esta, a do renascer, para prestar uma homenagem ao grande filme que deu origem ao título deste blog: Dr. Estranho Amor ou: como aprendi a deixar de me preocupar e a amar a bomba, de Stanley Kubrick.

segunda-feira, maio 16, 2005

Frágil – Mudanças.


O Estranho Amor está a mudar. Esta é a sua nova cara. Vai ficar mais introspectivo, mais egoísta e mais só, se calhar. Mais apaixonado seguramente. Novas razões ou velhas promessas continuam a alimentá-lo. Os comentários acabaram mas fica o E-mail para quem quiser escrever: dr.estranhoamor@gmail.com

Bom dia.


- Não te vi.

- Eu também não reparei que aqui estavas.

- Desculpa, não vou conseguir falar contigo. Acabei de entornar todas as palavras. Quem sabe amanhã fique menos miudinho.

- Sim. Vou dormir um pouco.

- E eu vou fingir que leio o Deserto dos Tártaros.

Tudo, apenas tudo e nada mais do que tudo.




Gostava de saber a força das tuas mãos e de espreitar a minha imagem reflectida nos teus olhos. Queria saber que coisa passas de mala em mala, inútil mas que te acompanha sempre por uma razão de sorriso. Precisava de mergulhar nos teus abraços para sentir o perfume.

Queria saber como vestes o peito, como arrumas as chegadas, como deixas que te abracem, como coras com os elogios e como te comoves com uma alma mendiga.

Tudo era o que eu gostava de saber. Não me basta ver-te a ler um livro com dragões.

sexta-feira, maio 13, 2005

Até para a semana.


O tempo agarra-me a garganta e a vida. Não deixa espaço para nada. Tento, no meio das inutilidades de chumbo, arranjá-lo para me lembrar de ti e das saudades do futuro que trazes. Arranjo lugares à pressa para, por exemplo, estacionar o carro muito perto do teu. Como se isso me confortasse o desencontro dos fins de tarde. Como se esses jogos de tenra idade não fossem para nós os mais importantes.

Os dias correm depressa à nossa frente. Tão depressa que mesmo os que me deixam órfão de te ver são um boato reconfortante de amanhã ou depois.

quinta-feira, maio 12, 2005

E estas o vento levou.




Há palavras que solto como quem solta um pássaro que o visgo roubou. Como se não gostasse de as ter só para mim, desalinhadas, assim como as arrumei. Fogem assim que podem, e eu sorrio com o juízo sentado à porta.

Espalho-as ao deus-dará como se quisesse semear tempestades para colher a brisa de uma boca. Só não falo sozinho porque tenho esperança que tu as vejas. E que te abracem enquanto corres sozinha a estrada onde ontem nos queríamos ter perdido.

quarta-feira, maio 11, 2005

Please, don't mind the gap.




Os dois sentados, quase encostados. Há um braço que se esforça por não fugir. Há nervos pequenos e compromissos brincalhões. Olha-se a fingir pela janela. Há desgostos instantâneos e um mundo que podia começar e acabar logo ali. Uma espécie de vou-ali-trocar-toda-a-minha-vida-por-fichas-que-quero-gastar-contigo.

Dava tudo por um azar ou pela tua fortuna. Sem cabeça, de repente, tudo em cima da mesa. Como um transplante de alma.

Chega o fim da linha. Os dois levantados, sem saber se são estranhos ou se são apenas alguém demasiado cúmplice que discutiu o suficiente para não se falar.

terça-feira, maio 10, 2005

Tangentes.




Sei que para cada escolha que fiz havia uma melhor. Para cada casa ou cama em que me encontrei havia, com certeza, outra que seria mais minha. Apesar de tentar, nunca devo ter sido perfeito e ainda bem.

Guardo assim a eterna esperança de um beijo melhor que todos os que gastei. De um céu mais azul do que o que me viu nascer. Tão azul que se calhar nem conseguiríamos olhar para ele. Fico à espera do encontrão da vida que passa por mim todos os dias.

segunda-feira, maio 09, 2005

Keith Jarrett, o Amor e o Ódio.


Um magnífico documentário sobre o pianista e o preenchimento do modelo 3 do IRS com anexo H e G roubaram-me o tempo para falar de Amor. Posso dizer que amo o improviso do primeiro e odeio o ritmo do segundo.

quinta-feira, maio 05, 2005

Apesar disto tudo, parece que nunca direi o que sinto nos olhos de quem merece.




- Vou falar-te de Amor. Sei muito sobre isso.

- Porquê? Amaram-te assim tanto?

- Não. Sou velho.

quarta-feira, maio 04, 2005

Desalinho.



Ando a juntar coisas para dentro de mim desde muito pequeno. Arrumo-as, separo-as e colo-lhes pequenas indicações sem saber como. Falta preencher ainda muitos vazios. Recantos poeirentos e esquecidos, zonas de passagem que ainda nem varri. Prateleiras e prateleiras magras que esperam por um encontro incerto.

Pelo meio dos caixotes com coisas inúteis vejo clareiras sombrias. Sítios onde ficou o que cedo trouxeste. Vazios onde o pó ainda não assentou. Como foi possível levares tanta coisa sozinha.

Entretenho-me a arrumar devagar o que te rodeava.

Fotografia: Robert Capa

terça-feira, maio 03, 2005

Palavras de Domingo.




- Olá meu querido. És tão bonito como a tua avó diz. E tens mesmo cara de espertalhão. Olha, diz-lhe que uma das jarras da campa está partida. Ainda hoje lá estive, lavei-a e mudei as flores. Ficou encostada à pedra que tem o nome dos nossos.

Post nº 400.


Serão estas 400 histórias importantes? Estarei eu melhor ou mais leve por as ter aqui deixado? Não sei. Mas 400 é um número grande de mais para o que eu julguei ser capaz de escrever. Siga. Para a frente é que é Lisboa e a partir daqui é sempre a descer.