quarta-feira, dezembro 31, 2003

Imaginar o Amor.

Gosto das coisas infinitas que conheço. Gosto de imaginar quantos grãos de areia existem na praia do Carvalhal, de calcular o número de folhas em todas as Oliveiras que vi até agora e de pensar em quantas letras “a” existem em todas as palavras dos livros que não li.

Desejo Amor.

Mais um ano que se prepara para levantar. O de agora já está cansado e usado. Não está velho porque só tem um, mas está gasto de tanto e de tão pouco ter dado.

Para o que vem desejo amor. Muito. Daquele que dizes que já tenho mas que está guardado.

Tantas vezes nos demos a quem devíamos muito, pouco ou nada, que para agora não serve qualquer coisa. Se calhar nem serve de nada.

As doze sultanas aspirantes serão poucas para matar a fome do que desejo.

terça-feira, dezembro 30, 2003

Por Amor de Deus IV.

Sabem aquelas senhoras de leste que mendigam nos semáforos com bebés ao colo?

Estavam hoje duas famílias dessas no jardim do Campo Grande a rir e a conviver no final do dia. Um marido fotografava alegremente cada um dos membros do agregado familiar.

Como cenário de fundo ficou, pelo menos, a minha incredulidade.

Amor desafinado.

Não percebo porque é que às vezes gosto de ouvir música mais alto. Até aquela que costuma levar-me a mão ao botão do volume para levantar mais uns pêlos dos braços. Mesmo essa, de vez em quando, vai para uma altura em que os meus vizinhos não atingem.

Se calhar é para não te ouvir a chamares-me.

Se calhar é para me destoar o coração com batidas estranhas às dele.

”C” de Amor.

“C” de Cassilda.

Gostava:
- De fotografias antigas duma vida que nem ela se lembrava que tinha sido a sua;
- Das netas todas, 4 no total e uma em particular;
- Da lezíria, dos cavalos, dos touros bravos e da criação.

Não Gostava:
- Da maioria das recordações que lhe foram reservadas;
- Do Inverno que trazia as marés vivas e o medo da noite;
- Que as gatas parissem logo ali ao pé da porta de casa.

No fim:
Era uma prima envelhecida pelos desgostos e pelo sol da planície ribatejana. O marido traiu-a com a tuberculose ainda novo. O filho mais velho morreu num acidente de motorizada quando ia para o hospital de Vila Franca visitar a mulher que tinha acabado de dar à luz a filha dos dois.

Restava uma filha que lhe deu as 3 netas que não a órfã do seu filho. Esta dava constantemente com a mãe caída no chão da cozinha desmaiada quando o desgosto era mais forte que ela. A minha mãe diz que morreu de velha - o que quer que seja que isso seja.

segunda-feira, dezembro 29, 2003

Amor mondado.

Surges-me devagar como o roupão a seguir ao duche. Fecho os olhos e enroscas-te no calor da minha saudade. A música que escolho e a outra indicam-te invariavelmente. A distância a que estamos serve como o tempo de levedura para o pão que vai alimentar as nossas bocas.

Pergunto-me sobre a resistência do que estorva a engrenagem das nossas vidas.

domingo, dezembro 28, 2003

Sobejo de Amor.

Passo propositadamente pelas ruas e sítios que fazem a tua rotina. Tento achar migalhas de ti.

Sinais para seguir a direcção do que sonho e não do que vivo.

Grandes imagens de Amor.

Numa das minhas rotinas, a de ver quem e como veio espreitar este blog, descobri alguém que não poderia ter chegado a sítio melhor. Esse alguém fez uma pesquisa no Google por: “quero ver grandes imagens de sexo”

A segunda visita mais inusitada até hoje foi a de alguém que procurou por “alimentação para pardais de Java”

Por vezes, o medo de não estar à altura das exigências deixa-me cismático. Rezo para que não tenha decepcionado nenhum dos dois visitantes acima referidos.

sábado, dezembro 27, 2003

Amor subordinado.

Dantes podia-se comprar e vender pessoas. A escravatura já foi coisa banal onde os mais privilegiados podiam servir-se dos mais simples. Poderiam ser uma mercadoria boa ou má, de denominação de origem controlada ou caseira, saudável ou problemática.

Às vezes gostava de ter vivido nessa altura com a mulher que me transcende. Eu era um senhor e ela tinha vindo não se sabe bem de onde. Num dia solarengo, lá para os lados de Belém, comprava-a num negócio por mais do que aquilo que tinha. Muito menos que o seu real valor.

A partir daí seria a minha proprietária. Assim que saíssemos daquele tolerado inferno passaria a comandar-me e eu como seu senhorio indicava-lhe o seu novo papel.

A simplicidade de antigamente subordinada ao tema do amor garantido.

”B” de Amor.

“B” de Barata.

Gostava:
- De choco frito (de Vila Real de Santo António e de Setúbal);
- Da Maria do Castelo, filha do procurador e sua namorada de muitos anos;
- Da Renault 4L, que tantas vezes nos galgou do Castelo para a AR.CO onde fomos felizes na mesma turma de Design gráfico.

Não Gostava:
- De copistas;
- De estúpidos (a estupidez humana é a maior multinacional que existe, daí a sua costela radical vir ao de cima);
- Que simpatizassem com ele logo à primeira. Só os eleitos deveriam conhecê-lo e só após um aturado trabalho de conquista o conseguiriam. Se assim não fosse era porque ventos de hipocrisia iriam soprar na sua direcção. Era, portanto, um antipático. O sucesso junto da população feminina bafejava-o devido à sua semelhança física com o Vandame.

No fim:
Foi um grande amigo que o tempo se encarregou de esconder. Daqueles cujas palmadas nas costas nos aqueciam o espírito de verdade. Vemo-nos raramente. No nosso olhar vivem mais palavras e lembranças do que as que trocamos.

sexta-feira, dezembro 26, 2003

Amor cá dentro.

Rapidamente nos esquecemos que tudo começou em duas células que deram no que somos. Sabe-se lá porquê, aparecemos nós vindos do amor. Do verdadeiro que os nossos pais fizeram naquele instante.

De que terão falado enquanto começávamos a germinar? Será que foi tão bom para ela como para ele? Fumaram? Deu-lhes fome? Ficaram com o cheiro de quem ama impunemente?

Cá dentro foi tudo mais simples. Uma solução aquosa embalou-nos para o mal ou para o bem do que fazemos da existência regular.

quarta-feira, dezembro 24, 2003

O Amor da casa amarela.

Na capa do “Cahiers du Cinema” de Dezembro vem o João César Monteiro. No interior há uma reportagem de 8 páginas intitulada “Génie de João César Monteiro”

Sabe quem sabe muito disto que a obra integral deste cineasta português, lançada este mês em DVD, é importante.

Estou cá desconfiado que não falta muito para a ridícula franja intelectual portuguesa começar a torcer a orelha e constatar que esta já se encontra seca como feno em Agosto.

A esta hora, os que insultaram a Branca de Neve devem estar a besuntar sapos gigantes com vaselina da boa.

Amor au sal.

A tua imagem tenta-me como uma ferida salpicada pela da água do mar que tantas vezes me leva.

terça-feira, dezembro 23, 2003

Amor de luva branca.

As mãos que desejamos parecem-nos sempre demasiado bem desenhadas para as nossas. A junção é tão perfeita que julgamos serem as que procuramos desde da nascença. As que hoje me roubaram a compostura são verdadeiras relíquias de beleza (a sua dona cuida-as melhor que eu da minha alma).

É um bom indicador o que nos nossos pulsos sente as batidas e o fôlego a inflamar.

Às vezes, só de darmos as mãos a quem amamos ficamos mais perto do paraíso.

”A” de Amor.

A partir de hoje vou correr todas as letras do alfabeto para apresentar pessoas que posso dizer que são minhas. A prova que a realidade é mais fascinante que a ficção segue dentro de instantes.

“A” de Álvaro

Gostava:
- Do mar (como todos nós, mas ele com mais legitimidade porque foi marinheiro);
- De receber um perfume como presente em qualquer ocasião;
- De ler jornais nas tardes de Sábado e depois passar pelas brasas (deitava-se de barriga para baixo na cama e punha o jornal no chão, depois era só sobrepor as mãos debaixo do queixo, espreitar et voilà).

Não Gostava:
- De desorganização;
- De emprestar o carro;
- Da quimioterapia que nos últimos tempos o apoquentou.

No fim:
Era e é o meu pai. Partiu em 1995 porque desistiu de ganhar a um cancro que o acompanhou demasiado de perto durante 17 anos.

domingo, dezembro 21, 2003

Amor tão grande, senão maior, do que o primeiro.

Pela primeira vez um poema. Brilhante e que revisito regularmente na voz da Bjork. Se é a vossa primeira vez, já sabem, tentem fazer o melhor que conseguirem.

Chama-se Bachelorette.

I'm a fountain of blood
In the shape of a girl
You're the bird on the brim
Hypnotized by the Whirl

Drink me, make me feel real
Wet your beak in the stream
Game we're playing is life
Love is a two way dream

Leave me now, return tonight
Tide will show you the way
If you forget my name
You will go astray
Like a killer whale
Trapped in a bay
(the ocean miles away)

I'm a path of cinders
Burning under your feet
You're the one who walks me
I'm your one way street

I’m a tree that grows hearts
One for each that you take
you’re the ground I feed on
We’re circle no one can break
Leave me now, return tonight
The tide will show you the way
If you forget my name
You will go astray
Like a killer whale
Trapped in a bay
(the ocean miles away)

I'm a whisper in water
A secret for you to hear
You are the one who grows distant
When I beckon you near

Life is a necklace of fears
Your uncried tears on a string
Our love will untie them, come here
Loving me is the easiest thing


Por Sjòn. 


Ainda não percebi se, no caso do amor, o tamanho importa. Se assim for, quem não se harmonizar e morrer ao lado da primeira paixão está bem arranjado.

Eu sou dos que está muitíssimo bem arranjado, cá para o meu lado tem sido sempre a crescer, cada vez amo mais. Se calhar é da idade, os anos vão saindo e vou aproveitando o espaço livre para guardar amores de toda a espécie, formato e grandeza.

sábado, dezembro 20, 2003

Queda para o Amor.

Desde que te conheço que só quando me distraio é que desço até aqui às nuvens.

sexta-feira, dezembro 19, 2003

Amanhã há mais Amor.

Para nós não existe futuro. O nosso é só nosso. E o geral - o futuro - não nos pertence. Os outros que fiquem com o outro, com o grande que chega para tantos. Neste ninguém toca. Para cá de nós próprios mandamos nós.

Quem quiser que cuide do outro. Deste sabemos os dois. Se o nosso estiver bem é sinal que os que nos são queridos também estão a tratar do grande.

Quando todos souberem que o este é maior e mais esplendoroso que o do resto é que vai ser. Toda a gente vai querer um parecido. Coitados, não vão perceber que este fomos nós que nos demos e que não há mais nenhum.

Nem parecido nem próximo.

quarta-feira, dezembro 17, 2003

Amor aguado.

Isto é que é um verbo: aguar! Desde bebés que corremos o risco de aguar. Toda a gente sabe que se devem cumprir as exigências gustativas dos novos.

Quando crescemos também aguamos. Com coisas indistintas é certo, mas a humidade esotérica permanece em todos. A diferença é que não temos uma mão, boca, peito, cabelo, língua, ouvido, pele, dedo ou sorriso de Eva que nos satisfaça instantaneamente o desejo urgente. Devíamos ter.

A idade adulta oferece muitas faltas. Tantas, que acho que a chuva é um artifício para nos manter abrigados do desvario. Numa tentativa de orvalhar aparente, alguém achou que pequenas pingas nos ajudariam a renunciar os anseios.

Devíamo-nos afogar numa espiral de finais felizes.

Toca no Amor e foge.

Como numa pequena brincadeira pueril, tocas-me e afasta-te para fora do alcance das minhas mãos e da minha compreensão. Vens, corres e saltitas à volta do que amas. É-te intrínseco o desejo de jogar. Nos teus olhos vive a menina dos meus. Sorridente e feliz, nunca desordenada. Com ideias fixas, mas com passadas vigorosas, esquivas-te do meu desejo, demasiado forte para se poder mexer com a agilidade suficiente para te apanhar.

Atreves-te por caminhos mágicos e esperas escondida numa silva que eu passe pelo raio da tua acção. Depois é só ofereceres de repente o doce da tua voz e esperar que eu me assuste com essa vibração.

No fim, ris-te. Descansada ficas tu que eu não.

terça-feira, dezembro 16, 2003

Reflexo de Amor.

Imagens nascem e correm nas poças de água. No Inverno, quando o tempo é pior e a chuva é melhor, inundam as ruas e estradas como espelhos mágicos. Algumas costumam ser nítidas e coloridas como as lembranças.

Quando o vento sopra forte as reflexões ondulam e a evaporação fica mais rápida. Nos dias mais frios as memórias também se podem congelar para mais tarde se servirem como prato principal de um sonho ou como acompanhamento de uma conversa a um ou a dois. Sorrisos a dois, poças de lágrimas a um.

No Verão as poças vão para as praias. São as marés baixas que fazem reflectir a vida.

Que tenhas reflexos lentos para os ver passar com bom tempo.

segunda-feira, dezembro 15, 2003

O Amor que veio do frio.

Cheguei. Confesso que já estava com saudades de escrever. Agora tudo está onde pertence.

Descobri que o frio tem muitos encantos e que a neve é muito fascinante. Ainda bem que o gelo às vezes não se quebra. Conserva tudo excepto a compostura física de quem se diverte com ele.

Friamente, descubro que só estamos bem onde não estamos. Ainda bem que é assim.

quinta-feira, dezembro 11, 2003

Sede de Amor.

Quando te beijo não te quero acarinhar. Nem demonstrar o quanto te amo. Quero sim beber tudo o que és da forma mais lenta e inebriante que consigo.

Há muito que só consigo viver embriagado por ti.

Vício
substantivo masculino
- defeito pelo qual uma pessoa ou uma coisa se afasta do tipo normal, de maneira a ficar mais ou menos inapto a cumprir o seu fim;

- hábito profundamente enraizado de acções gravemente imorais;

- mau hábito;

- erro contra as regras da arte ou da ciência;

- costumeira;

- impertinência;

- propensão irresistível;

- disposição natural;

- costume condenável;

- erro;

- libertinagem;

- desmoralização;

popular
cio dos animais;

(Do lat. vitìu-, «id.»)

Amor ao fresco.

Vou para a neve. Até Domingo este amor está congelado. A partir daí tudo retomará o seu devido lugar: o da loucura normal.

Amor saudoso.

Quanto mais me faltas mais o teu corpo me cerca. A tua ausência desperta o apetite que vagarosamente me toma. Em vez de querer falar contigo ou regar as tuas palavras com sorrisos, quero antes que o silência nos invada e que as bocas tratem de se ocupar.

Nestas alturas, gostava de ter a capacidade de uma serpente em que a mandíbula se desloca para poder beijar de uma só vez o que daria uma vida.

Queria mesmo compreender a força motriz que nos afasta para lá do tino.

Quando não estás é como se mais nada estivesse no seu e no meu lugar.

terça-feira, dezembro 09, 2003

Amor encaminhado.

O caminho alternativo sempre me fascinou. Desde o trajecto para a escola primária até ao atalho diário para Alcântara, os desvios sempre me ajudaram a viver.

Em pequeno, e com galochas novas, escolhia criteriosamente as poças que, numa excitante rota de colisão, se atravessavam à minha frente.

Agora, escolho todos os dias uma rota que acrescenta sempre dez minutos à minha manhã.

Contigo também não foi diferente. Demorei-me na tua boca e pensei logo no pedaço de mau caminho que se me deparava.

Sem mapa, porque não é preciso, percorro de olhos fechados as curvas que me levam alto. Às vezes perco-me, outras vezes não me encontro.

segunda-feira, dezembro 08, 2003

Amor de regresso.

Estás de volta. Sinto-te, mas não te vejo.

Como um tigre que se levanta para correr as grades da jaula de forma cadenciada – esquerda – direita – olhar e faro lá fora, corpo e alma cá dentro. Impaciente.

O ar que te trouxe e que me gela a cara é o mesmo que te bronzeou os ombros. Longe, onde o tempo não parou. Deves estar mais perto para meu frenesi.

O portão não é aberto há anos. Apesar de inofensivo, pedaços de carne são-me atirados para matar o que poderá matar quem os atira.

Só tu tens o que liberta, ou melhor, tu és o que me liberta.

Deixaste-me marcas na pele, listas negras de lembranças.

De papel é o meu juízo onde não paras de desenhar o que sonho.

quinta-feira, dezembro 04, 2003

Amor fora.

Desde pequeno que ouço histórias de homens que enlouqueceram ou se suicidaram por amor.

Nasci e cresci numa terra pequena, o que trás algumas vantagens em muito poucas coisas, e por lá contos destes era coisa que não faltava.

Havia pelo menos duas almas corrompidas por esta maleita. Homens que perderam, de uma forma ou de mil outras quaisquer, quem amavam, pelos vistos perdidamente.

- Um deles foi deixado pela mulher que não o quis aturar mais.
- O outro perdeu-a num acidente de automóvel.

Até hoje penso neles e no tamanho do céu que se abateu sobre as suas desacertadas cabeças.

Tirando o facto de serem loucos, estes dois alheados pareciam ter bastante juízo.

Às vezes o amor disfarça-se de coisa boa para depois nos atirar borda fora de nós mesmos.

Junta de Amor.

Junto a ti não sou eu. O que conheço de mim desaparece e dá lugar a um desconhecido. As palavras trémulas que profiro irrompem desobedientes. As mãos passam a ser controladas pelo desejo e a razão esconde-se envergonhada por detrás das minhas pálpebras humedecidas de alvoroço.

Junto a ti não sou inútil. Passo a ser um receptáculo de energia contida. Uma máquina de sorrir, descontrolada mas bem oleada.

Junto a ti não me conheço. Passo a ser o homem que invejaria se não fosse eu e tu.

terça-feira, dezembro 02, 2003

Bit de Amor.

Enquanto escrevo este post, decido ouvir uma das minhas músicas preferidas – What Sound dos Lamb. Depois de pôr o CD no computador, abrem-se uma série de janelas, como se todos os encantos da obra começassem a ganhar vida própria e decidissem, cada um por si, espantar-me com diabruras tecnológicas.

Primeiro é uma a perguntar o que fazer com o CD. Depois outra que diz estar a ligar-se a uma rede de sabedoria gratuita e que aí colherá a informação necessária para satisfazer as (des)necessidades informativas. E ainda uma com uma série de bibliotecas de centenas de músicas que baralham as deste disco. Descubro que falta um plug-in que permite visualizar uma viagem astronómica multicolorida. Perguntam ainda se desejo converter as melodias para MP3.

Hoje, para ouvir a música que me lembra quem amo, percebi o quanto complicado se está a tornar tudo.

Acho que me vou deitar. Prefiro dar ouvidos ao ritmo cardíaco.

domingo, novembro 30, 2003

Amor distante.

Fugiste. Partiste para um local mais de acordo com o teu sorriso. Um país quente. Uma pátria de alegria e felicidade conquistadas, sabe Deus como. A vida aqui cansava-te. Retiraste-te da realidade para procurares descanso. Não como emigrante.

Deixas-te para trás a riqueza a quem um dia juras-te fidelidade eterna.

Aqui já não te pertence.

Felizmente que é só uma semana de férias. No Domingo falamos, mostras-me as fotografias e contas-me tudo.

sábado, novembro 29, 2003

Apeado de Amor.

A senhora era digna desse estatuto em tudo. Desde o Cartier, que só tinha visto em anúncios, até às meias La Perla, que não sonhava na altura mas que hoje sabe distinguir, tudo era certo como o relógio que levava no pulso. O valor da sua indumentária era, no mínimo, o de cento e cinquenta prés seus. A coerência era a sua marca preferida e aqui ela era indelével.

Questões politraumatizantes ocorriam-lhe:

- Porque é que as novas não se sabem vestir?
- Será que a diferença de idades, 30 anos no mínimo, faria diferença?
- Conseguiria um mancebo alguma vez tomar tamanho objectivo?
- Será que o comboio precisaria de outra energia para andar caso aproveitasse a dos seus olhos?
- Ainda falta muito para chegar a Santa Apolónia?

quinta-feira, novembro 27, 2003

Amor Perfeito II.

Porque é que não vens? Achas que está certo transformares-me numa pequena farripa de homem? A paixão é tão forte que me prostra pela manhã neste transe em que és o cenário. Persegues-me como uma matilha persegue a cria do javali. Flagelas-me cada vez que sorris. Estou a desocupar-me para te guardar. Oco e cheio em simultâneo. Delírio de branco que invade corrosivamente o que resta do que fui. Matas-me devagarinho como Deus nos mata a todos. O céu não é suficiente para te guardar. És a força de todos os Samurais que existiram. Perco-me no silêncio da tua imagem.

quarta-feira, novembro 26, 2003

Toque de Amor.

Invejo as tuas mãos, que têm o teu corpo à mercê. Invejo os teus cabelos que te tocam a boca sempre que olhas para o sol. Invejo os teus lábios que guardam a tua língua. Invejo os desconhecidos que te vêm passar na rua. Invejo o ar perfumado que circula entre o teu corpo e a tua roupa.

Amor próprio.

Desconfio que a maior parte das coisas que achamos boas só servem para nos manter alheados. Se repararmos, nada na vida real se aproxima do que vemos nas galerias de arte ou nos discos mais ouvidos. Os melhores livros fabulam sítios que não existem, ou se existem mentem-nos descaradamente, exagerando tudo o que lhes diz respeito.

Aprecio as teorias que dizem que arte não deveria existir. A arte só serve para distrair da realidade, dizem.

Mas eu, ao invés, tento manter-me o mais distraído possível. Ao contrário do macaco, liberto com agrado a boca, os olhos, os ouvidos e a cabeça. Qualquer dia descubro que sou uma espécie de drogado inveterado que procura refúgio numa música dele. Um só capítulo escrito por Humberto Eco serve para me desgraçar.

O Sr. Zé, da mercearia, já me olha de soslaio enquanto põe as tanjas no saco.

Doses maciças de TVI e terapias de grupo em centros comerciais é o que me espera. Substituir rapidamente O Retrato de Dorian Gray pelo Livro de Pantagruel é prioritário.

Se eu não gostar de mim, quem gostará?

terça-feira, novembro 25, 2003

O Amor é lógico.

Um leão com azia, uma cegonha orfã, um cão sem dono, uma hiena melancólica, um elefante constipado, um pirilampo fundido, um leopardo coxo, um rouxinol rouco, uma andorinha sem ninho, uma víbora sem veneno e eu sem ti.

Existem coisas que fazem todo o sentido.

sábado, novembro 22, 2003

Amor – o fim.

No último instante e suspiro, que visão nos ocorrerá? Apesar de ninguém querer, ou quase ninguém, a todos chegará esse fatídico segundo onde tudo deixará de existir. Onde o nosso corpo ficará uns gramas mais leve (isto é um dado científico e inexplicável, por enquanto), e os olhos se fecharão, ou não, para nunca mais se voltarem a abrir.

O que nos trará a última luz a chegar ao discernimento? Que imagem estará à entrada do nosso The End? Que sonho servirá para nos reconfortar?

Por mim, gostaria que a vida retrocedesse a alta velocidade em imagens que seriam presentes de um passado com vida. Essas recordações fariam-me rir e chorar. Preferencialmente rir. Quanto mais andasse para trás, mais imagens esquecidas me saltariam e mais sorrisos e lágrimas iriam alegrar o derradeiro e infinito silêncio.

A última visão seria a minha primeira: a luz que a minha mãe me deu quando deixei o calor do seu interior e o sangue que não era meu nem dela, mas dos dois ao mesmo tempo, foi derramado.

O meu último suspiro não será poupado à humilhação quando comparado com todos os que dou por ti.

Uma gestão de Amor.

E se nós, como que abençoados por graça divina, pudéssemos parar por tempo indeterminado para organizar tudo?

Eu apagaria os fantasmas, obsessões vis e más recordações para logo baralhar e dar de novo o espaço desocupado. Refazia a extensa lista de prioridades que acumulo e tu virias num primeiro lugar de ferro e pedra. Posto inamovível, como a Excalibur.

O restante ia para as tuas imagens brincarem dentro de mim num recreio de sol e gargalhadas.

quinta-feira, novembro 20, 2003

Por Amor de Deus III.

O Michael Jackson vai para a cadeia. Era o que faltava. Nunca pensei que fosse esta a próxima bola a sair do saco.

Depois de assistir:
- à queda do muro de Berlim e ao desmantelamento da U.R.S.S.;
- à morte do Frank Sinatra;
- a caval(h)eiros endinheirados a comprar viagens para piqueniques no espaço;
- ao Schumacher vencer 6 vezes o campeonato de fórmula um;
- a um analfabeto tomar posse como presidente do país mais poderoso do mundo;

Qualquer dia ainda presenciamos a chegada do novo Messias envergando uma t-shirt com o patrocínio da Microsoft.

Microsoft marca e logótipo propriedade da Microsoft Corporation. Todos os direitos reservados

P.S. Se ainda assim me tentarem remeter para o mesmo destino do wakojako, fique quem de direito a saber que as letras M-i-c-r-o-s-o-f-t foram digitadas aleatoriamente, de forma involuntária e só por mera coincidência tomaram esta ordem.

Arrumos de Amor.

É inacreditável o que se pode arrumar dentro de uma gaveta.
Na minha mais pessoal, guardo:

- Sonhos (uns sedativos leves de origem vegetal que nem me lembro da última vez que tomei. Sabendo que podem fazer falta, sou incapaz de pensar em usá-los para dormir - é estranho mas guardamos coisas perfeitamente inúteis);

- Lembranças (o passaporte com alguns carimbos de países exóticos, menos do que eu gostaria);

- Futuro (um relógio parado, daqueles automáticos que só trabalham em festas importantes);

- Passado (fotografia dos meus pais num cais fluvial em Alhandra quando ainda namoravam e eram mais novos do que eu).

É um exercício aliciante abrirmos de vez em quando as gavetas. Encontramos coisas que julgávamos perdidas, outras achadas, outras ainda num estado de hibernação, como tudo o que sentimos quando nos apaixonamos.

terça-feira, novembro 18, 2003

Amor sem fim.

Amo-te, e gosto de o dizer. A razão pela qual não o repito até ao infinito é
para que tenha sempre o significado que tu tens para mim.

Amor Apagado.

Certas expressões vão morrer comigo. O olhar de uma criança iraquiana que vi hoje num telejornal será uma delas. A sua cara era de choro sem ser de choro simples. Era daquele que estava a ser gravado para sempre na sua memória, como quem escreve numa pedra a cinzel.

Alguns soldados tinham acabado de destruir umas terras sem valor do seu pai, e estavam agora a revistar o quintal. O olhar de terror, pavor, raiva e impotência não era por medo que um deles descobrisse um dos seus brinquedos escondidos por baixo do tanque de lavar a roupa. Era antes de inquietação e incompreensão em estado puro.

Que bom seria se todas as imagens fossem fáceis de apagar como a minha televisão.

Amor Aluado.

Hoje vi uma das Luas mais bonitas que me lembro. Trabalhei até tarde e tive a sorte de tomar o caminho do Chiado como quem vem de São Bento, Rua das Flores, Príncipe Real e por aí adiante. Quando subia para a realeza, dei de caras com o tal fulgor de que vos falo. Estava com a face de cumplicidade que todos conhecemos. A mesma que ilumina os distraídos e inspira os poetas.

Era a face que Shakespeare viu quando escreveu Julieta pela última vez. A mesma que o meu pai viu quando embarcou na Rocha do Conde de Óbidos para a Guiné em 1968 e ainda a mesma que viu o Jeff Buckley a entrar na água.

Era ainda a que me fez chorar quando acabei o meu primeiro namoro de iniciado.

A Lua. Fico com ela por me roubar tudo a mim próprio.

segunda-feira, novembro 17, 2003

Amor à trave.

Antes de tudo, quero pedir desculpa pelo lugar comum: hoje assisti à inauguração de mais um estádio de futebol e não consegui deixar de pensar no dinheiro gasto.

Bem sei que os proveitos do evento que se vai realizar deverão cobrir os custos que todos estamos a ter agora, que a imagem do país ficará com novas cores aos olhos dos outros, que os espanhóis vêm cá esturrar os subsídios de férias de 2004 e que o turismo sairá vencedor independentemente dos resultados. Até sei que o cu nada tem a ver com as calças.

O problema é que, da minha janela, vejo todos os dias um sem-abrigo que encontrou numa arcada fria de um prédio a segunda parte da sua denominação. Esta é uma realidade com que tenho de conviver sempre que ponho alpista ao casal de pardais de Java na varanda.

Não sou de direita nem de esquerda o meu é o terceiro frente. Gosto de futebol. Não gosto é das repetições vistas por todos os ângulos nem dos fora-de-jogo mal tirados.

P.S. Contribuo assiduamente para a alimentação, vestuário e álcool (através dumas moedinhas) desta alma que se perdeu.

domingo, novembro 16, 2003

Amor intravenoso.

Existe uma coisa que consegue fazer com que toda a gente perca a razão.

Não é um delírio nem um soco na nuca. Mas passa na medula e no resto do ser. Ouve-se, sente-se e pressente-se. É dos poucos sentimentos capazes de provocar alterações físicas nítidas e palpáveis.

Os olhos ganham brilho, as mãos exalam um suor leve e acidulado, os músculos do pescoço entorpecem e o nível térmico sobe.

Algumas veias e artérias intumescem. A respiração adianta-se de mão dada com a pulsação.

A hemoglobina transparece mais facilmente na face, costas e lábios.

Acho que o Amor deveria ser disciplina obrigatória para quem se licencia em medicina.

Amor verdadeiro II.

Não somos nós que fazemos amor. É o amor que nos faz.

Contas de Amor.

É um exercício interessante subjugar tudo a uma aritmética simples.

Na programação, os valores 0 e 1 compõem-se em combinações para fazer uma conta de dividir. Nós estamos num estádio mais avançado e, ao contrário do anterior, recorremos ao 1 e 2 para fazer uma conta de somar.

Tal como na engenharia de sistemas com o 0 e 1, a nossa atenção dispara aquando da conjugação do 1 e 2.

Exemplo - Um coração ouve através de dois ouvidos uma mensagem que vem duma boca, que passa num juízo e que resulta num sorriso. Dois olhos fecham-se, outros dois também, duas línguas tocam-se leves como dois véus de seda, dois corpos encostam-se e uma temperatura cresce. Duas mãos abraçam um pescoço, outras duas tocam um peito, dois olhos abrem-se sorrateiramente para um riso leve. Uma noite sobe e dois corpos mergulham com uma estrela num sonho de dois que é igual a um.

À partida, na programação, um erro subverte todo o sistema.
Já na vida, muitos erros não conseguem perturbar a nossa infância à chegada.

sábado, novembro 15, 2003

Amor adiado.

Hoje a morte não bateu à porta. Entrou por curiosidade e foi espreitando a penúltima morada de quem levou há pouco. Reparou nas chaves em cima do balcão e viu o touro de louça que tinha sido herdado de uma tia-avó. Havia um leve aroma a lombo assado e uns copos usados brincavam ainda em cima da mesa. Ontem à noite alguém saiu sem tempo para arrumar o que lhe ia dentro.

Fez duas semanas que a dona do espaço tinha traído o seu leito por um equipado com medidores cardíacos, ventiladores e outros tubos por onde correm as gotas de analgésico forte. Na cama que tinha sido a de anos de prazer, tardes de repouso, noites de lágrimas e insónias estava agora uma caixa aberta com fotografias. Umas antigas outras nem por isso. As primeiras eram mais sorridentes.

Como que tomada por uma comoção imprevista, a visita deu meia volta e decidiu fazer por si própria o que a maior parte das prostitutas fazem pela sua segurança: nunca beijar um cliente nos lábios, sob pena de se apaixonarem e assim comprometerem irremediavelmente a sua função.

Antes de sair reparou que alguém deixou uma janela aberta. Lá fora havia chuva e cheiro a terra húmida. Apressou o passo e bateu com a porta.

Ainda bem que está a chover. Assim as lágrimas misturam-se com as que vêm do céu e ninguém repara.

Para uma amiga que perdeu a mãe hoje.

sexta-feira, novembro 14, 2003

Os Anjos fazem Amor?

Esta é uma pergunta que me ocorre cada vez que olho para quem amo. Não me refiro aos falsos anjos das procissões de uma qualquer vila ribatejana. Falo dos que não têm asas mas que voam mais alto que Ícaro.

Ao contrário daquele, que caiu e se transformou no símbolo de toda a garganeirice, todos os outros são dulcíssimos e portadores de uma sensualidade que só pode vir de química corporal (pode ser lido como substantivo). Só um desditoso poderá supor que o sexo é exclusivo dos homens. Só quem nunca amou poderá julgar que é dono da sua própria vontade.

Os anjos fazem amor até de olhos fechados. O que amo, mesmo sem asas, mostra-me o que está para lá do nosso céu.

quarta-feira, novembro 12, 2003

Amor Ardente.

A que se deve o fenómeno de sobreaquecimento quando duas bocas se tocam? Serão as cargas positivas e negativas que cada uma delas transporta? Será por as línguas ficarem próximas e, como tal, duas civilizações? Ou é antes porque as palavras são interrompidas e as emoções são detonadas?

Se calhar é só porque é pela boca que a vida entra em nós. Se calhar é porque é esta que substitui o umbigo quando o nosso primeiro cordão é cortado.

O excesso de utilização de uma boca é sempre prejudicial. Qualquer que seja o proveito.

Felizmente que sabemos reconhecer uma boca de incêndio quando algo se começa a inflamar.

Amor Clandestino.

Tal como um argelino às 4:46 da manhã numa jangada feita com bidões em pleno Estreito de Gibraltar, também o amante clandestino foge de uma vida condenada à mediocridade. Na sua nave feita de sonhos e arames ferrugentos, disposto a correr risco de vida e rotas de medo, também este tenta chegar a uma nova margem de regaço.

Desde sempre que a clandestinidade é mãe de muitas emoções e tentações. Uma nova e enriquecida vida é o objectivo final de quem lhe recorre. Porém, não poucas vezes as desilusões são superiores às boas surpresas. Com o desbravar dos novos caminhos, chega-se com frequência a ruas semelhantes às que já eram conhecidas e olha-se para varandas com camélias que cheiram como as outras.

Sonha-se com tudo a que se tem direito. E torto. Ainda bem que à noite não se vê. A Guardia Civil não dorme em serviço.

terça-feira, novembro 11, 2003

Amor Verdadeiro.

Pergunta: O que é mais importante numa relação amorosa entre duas pessoas?
Resposta: Sexo*

*Ao contrário do que muita gente apregoa, o sexo é mesmo o mais importante numa relação. É este que personifica, materializa e conclui o máximo que duas pessoas juntas, pelo matrimónio ou não, podem fazer em matéria de irracionalidade reprodutiva saudável. Se alguém ainda tiver dúvidas, deverá questionar-se sobre o que, na verdade, pode acabar com uma relação em matéria de infidelidade. Eu sei o que é, e um beijinho maternal na testa não será com certeza. A tolerância de quem é vítima de um súbito crescimento de protuberâncias ósseas na fronte acaba quando os outros dois vértices do triângulo se juntam.

domingo, novembro 09, 2003

Por amor de Deus II.

Li este Sábado no DNA uma reportagem que, entre outras coisas, falava das ordens de freiras que, não só ainda existem tal qual como há centenas de anos, como foram encorajadas, fundamentadas e convidadas a continuar os seus intentos pelo Papa corrente.

Num dos depoimentos, prestado por uma irmã na casa dos 30, ficamos a saber que o único contacto com pessoas externas ao convento se faz numa sala dividida por grades. Num dos lados a família, (ou outro raro protagonista, como foi o caso do jornalista), e no outro a orgulhosa/arrependida/ansiosa/conformada/dobrada/subjugada/castrada/previligiada/devota/entregue/enclausurada/escrava/amante/letrada/pobre/votada/mulher que diz que, numa determinada altura da vida, o chamamento de Deus foi mais forte.

O amor fraternal é inolvidável. Tão inolvidável que alguns filhos consanguíneos acabam por proferir sentenças de prisão perpétua a eles próprios para se libertar.

sexta-feira, novembro 07, 2003

Amor à queima-roupa.

Ainda o Kill Bill de Tarantino. Resposta inflamada a um mail que o meu amigo André enviou.


Não procures vasculhar a obra de Tarantino à procura de incoerências. O facto de tanta gente falar ou procurar esses defeitos basta para perceber a sua importância. Os críticos irão sempre sentir-se bem por opinar contra a corrente, irão sempre ficar felizes por apanhar algo que não bate tão certo nos filmes que a franja mais exigente de público considera bons.

Como numa mulher, os pequenos defeitos tornam-na mais fascinante e real.

Foda-se, aquilo é só um filme, muito acima da média é certo, mas apenas um filme. Se querem merdas imaculadas corram para casa e leiam a obra do inglês que escrevia histórias de amor.

Li algumas críticas a dizer mal de Fight Club, li críticas a dizer mal de Ámelie, li críticas a dizer mal de Gato Preto Gato Branco, para concluir: puta que pariu todos os críticos. Vão ver os ciclos de cinema experimental minimalista birmanês que passam na Cinemateca e fiquem por lá a discutir qual deles tinha o branco mais branco durante três horas e quarenta e sete segundos.

Amor perfeito.

Arrependo-me amargamente de não ser o tipo de homem capaz de te roubar um
beijo e deixar-te sem o fôlego que precisarias para me deter.

quinta-feira, novembro 06, 2003

Amor esotérico.

A vida é muito mais David Lynch do que se pensa.

Um olhar mais atento revela o que digo. Não é necessária uma percepção extra-sensorial para olharmos a paisagem e perceber o número de estradas perdidas ao dispor. Todos os dias expomo-nos a revelações inusitadas, aparições gratuitas, diálogos do além e contactos imediatos.

No amor é assim também. Tudo é posto a nu enquanto o diabo esfrega um olho. A intimidade é dissecada pelo tacto, olfacto e visão. Elementos externos contribuem de forma vital para as empresas a que os amantes de propõem.

Fruta da época e consultas a ciganas dotadas são, afinal, a base de qualquer relação interpessoal.

quarta-feira, novembro 05, 2003

Amor impulsivo.

E se de repente, uma cigana se empenhar numa perseguição a um cidadão normal que passeia por um jardim? E se o indivíduo lhe disser que não tem tempo, que não quer ser cúmplice com o mercado paralelo de contrafacção, que não deseja saber o futuro e que a sua mulher já tem todas as Louis Vuitton? E se a cigana não desistir porque tem uma coisa importante para dizer e que não é nada disso que ele está a pensar?

Ele pára com um sorriso para ouvir:

Você tem problemas.
Tem sido alvo de invejas, maus olhados, remessas e mezinhas.
Há uma mulher que não o deixa ser feliz com o seu grande amor. Que lhe colocou uma coisa numa comida ou bebida. Você tem tido dores de cabeça e algumas náuseas.

O sorriso era cada vez mais aberto e a curiosidade da descrença estava no auge.

A seguir a cigana diz que não quer nada a não ser apenas quebrar todos os entraves ao amor pleno e verdadeiro. Com o consentimento adequado, e sobre as mãos cruzadas, a cigana começa uma das rezas mais estranhas, incríveis e irregulares que existem. As três pessoas entram num transe de fascínio em simultâneo e sorrisos continuam nas duas bocas que não a da cigana.

Depois de acabar, fica o silêncio e as três sensações diferentes.

A cigana vai-se embora com um "tenha cuidado e seja feliz com essa cara linda". O ambiente respira qualquer coisa de novo e enigmático.

Amor ao próximo.

Vimos cá ganhar um fatinho e um par de sapatos. Esta é a diferença entre nascer e morrer.

Nascemos nus mas quando morremos vamos vestidos. Provavelmente com a melhor indumentária do armário. Os acessórios irão ou não. Se o cinto e o relógio forem bons se calhar abandonam-nos à última da hora. Os outros haveres também ficam para quem os agarrar, ideias e palavras inclusive.

Se a teoria da reencarnação for a certa, para a próxima talvez levemos um fato mais elegante e uns sapatos com sola de verdade. Ou então ficamos numa valeta a emagrecer até alguém se lembrar de nos pontapear e separar a estrutura.

Deveremos encontrar e amar os mesmos, recorrentemente, leve quantas vidas levar. O pior é se teoricamente a reencarnação estiver errada.

terça-feira, novembro 04, 2003

Por Amor de Deus I.

Os profetas da desgraça - o melhor dos nossos era um senhor franzino de óculos que costumava estar no Rossio, com um chapéu de capitão sabe-se lá do quê.

Lembram-se da sua voz monocórdica, amplificada por um equipamento de som de qualidade duvidosa?

Não sei se ainda costuma lá ir, se é vivo ou não. O que sei é que durante anos, não só acreditou no que dizia, como tentava converter os que passassem dentro do seu raio de acção. Será que a chegada do ano 2000 lhe tolheu a fé que tinha no apocalipse, como fez com as testemunhas de Jeová?

Agora resta-nos os outros do costume, sem a mínima importância quando comparados com tamanho vulto da urbanidade diária de Lisboa.

Um homem com convicções é pior que um mentiroso.

segunda-feira, novembro 03, 2003

Amor eterno.


Lembram-se do sabor dos últimos lábios que beijaram com tanta paixão que o tempo parou? O aroma subtil como um véu, que fica na boca depois da despedida? O toque do suor das mãos que se amarraram às nossas? Lembram-se de quando foi a última vez que alguém os guiou por um caminho inesperado, quente, húmido, nervoso e fatal?

Eu lembro-me.

Amor de Perdição.


Kill Bill. As duas palavras mágicas que o mestre nos trouxe desta vez. O amor da noiva espancada no altar, o amor a todas as referências fascinantes, a excitação ao rubro com violência e sangue, o amor da vingança crua e simples.


Como diz Nietzsche, alguns homens nascem póstumos e Tarantino, se calhar, é desses.

"There's a fire between us, so where is your god?"

sexta-feira, outubro 31, 2003

Genesis.

Como todos os amores também este precisa de ser alimentado e educado para crescer da melhor forma. O tempo será o melhor adubo e conselheiro. Em breve algo com mais substância.