terça-feira, novembro 18, 2008

Uma música para a memória e para o futuro.



Blue Dress - Depeche Mode (o video é de contrabando).

Depois da fase mais violenta da minha vida, alguma bonança se avizinha. Em vez de violenta pode ler-se dramática (no sentido que os ingleses também lhe dão - fortíssima, poderosa, intensa).

Talvez este blogue volte um destes dias.

terça-feira, outubro 28, 2008

Mãe, consigo sentir a terra a cair-me na cabeça.



I know it’s over dos The Smiths por Jeff Buckley, ou aquilo a que se pode chamar Génios encavalitados.

Aqui está a letra para quem tiver coragem.

terça-feira, setembro 30, 2008

This is the end, my friend. My only friend, the end.



Actor e personagem com a consciência mínima para uma violência máxima. Não consigo acompanhar muitas coisas, este blogue é uma delas.

quarta-feira, setembro 03, 2008

Quem me dera estar aqui.



Só Deus, se existisse, é claro, saberia o que estou a sentir neste momento. Falar com ele sobre essa sapiência seria uma coisa de amigos. Até que ponto daria desconto à minha coscuvilhice? Sim, porque eu assim que desconfiasse que ali havia assunto do forte, não me ia calar tão cedo – já me conheço (mas não o suficiente para saber o que trespassa estes pulsos cada vez mais fracos).

Não exagero, como não exageram os bêbedos que se seguram a sinais de proibido para se manterem de pé. Nem os drogados, naquela madorna fabulosa que lhes rouba o centro de gravidade, exageram. No fundo são coisas de desgraçados, há que perceber. Também esperam por Ele para ver se arranjam amanho ou as tais explicações.

Só que estes não lambem a lembrança dos teus dedos. Nem cheiram o fim dos dias nos teus cabelos.

A vantagem deles é que o que o efeito da sua droga tem um fim. E eles acham que isso é uma coisa má.

Até dá vontade de rir.

Fotografia: Thierry Le Gouès

segunda-feira, setembro 01, 2008

Banda Sonora das férias.

Isto porque eu sou um homem, diria, sui generis, ou simplesmente com problemas (pelo menos o vídeo é um dos melhores que já vi).



Street Spirit (Fade Out)

Rows of houses, all bearing down on me
I can feel their blue hands touching me
All these things into position
All these things we'll one day swallow whole
And fade out again and fade out

This machine will, will not communicate
These thoughts and the strain I am under
Be a world child, form a circle
Before we all go under
And fade out again and fade out again

Cracked eggs, dead birds
Scream as they fight for life
I can feel death, can see its beady eyes
All these things into position
All these things we'll one day swallow whole
And fade out again and fade out again

Immerse your soul in love
IMMERSE YOUR SOUL IN LOVE

Radiohead

domingo, agosto 24, 2008

De Férias.

Vou ler, esperar pela água morna e sorrir com vida em Standby.

quinta-feira, agosto 07, 2008

Balança injusta.



Estou aqui a pensar nisso de estares a emagrecer e acho que não me agrada. É que gosto tanto de ti que fico a pensar que esses nove quilos que perdeste são, afinal, uma considerável parte de ti que desapareceu.

E eu que não faço ideia para onde terá ido isso que eras tu. Nove quilos ainda é muito e não estavas feio. Percebesses de mulheres apaixonadas e não acharias esta conversa uma palermice.

Mais valia ires-te dando a mim nem que fosse aos poucos, podiam ser essas migalhas que se vão evaporando todos os dias.

Fotografia: Eric Traore

terça-feira, agosto 05, 2008

Time, that little tricky moterfucker.

Nas guerras de hoje, imagino a mãe de um soldado à espera de uma mensagem no telemóvel que lhe diga que o filho está vivo e que a operação de hoje de manhã correu bem.

Dantes uma destas mães descansava mais, afinal de contas uma carta era coisa que levava o seu tempo mas, muitas vezes, o seu filho.

segunda-feira, julho 28, 2008

Simplesmente Maravilhosa.



Esta expressão poderia ser aplicada a ti como um fato de costureiro insuspeito. Contudo, como se as desgraças que sou não bastassem, usaste-a para outro fim, ou princípio - já nem sei.

Deverias ter tido mais cuidado, quem sabe até ter mentido, à pergunta da tua amiga “Então ontem como foi? Não é todos os dias que se tem uma primeira noite com alguém por quem se está apaixonada”.

Não que tenhas feito mal ao dizer o que sentiste, só que este elogio é tão grande que me deixa a vida à sombra.

segunda-feira, julho 21, 2008

Música nova.



Love is Noise – The Verve, 11 anos depois, o novo álbum está para sair. O tema do primeiro single é o mesmo daqui, pois então.

quarta-feira, julho 16, 2008

À espera das 9:05





- Gostas de mim?

- Sim, há tempos que é assim.

- Ai! Vou ali morrer e já volto.

Fotografia: Eric Traore

segunda-feira, julho 14, 2008

Amor.

Lá está. Eu sabia que havia qualquer coisa que impelia esta forma de tratamento para a desgraça.
Shame on all men.

Só um homem é capaz de achar lamechas tratar a mulher que ama por Amor.

sábado, junho 28, 2008

É a promessa de vida no teu coração.



Águas de Março - Elis Regina e Tom Jobim – desaconselhável para quem está com lágrimas de felicidade mesmo à mão de semear.

Estarei de férias até dia 13. A areia nos pés pode ter vários significados, para aqui será o de uma travessia no deserto.

segunda-feira, junho 23, 2008

Definitiva.

Até aqui menti cada vez que disse de verdade és a mais linda do mundo (umas vezes mais do que outras é certo).

Sempre fui um homem com sorte, mas isto é ridículo. Pensava que a minha vida estava fechada no que a revoluções diz respeito. Que a idade e as oportunidades que me foram reservadas concluíssem o ramalhete de convulsões a que tinha direito.

Mas não.

Agora tu, que repetes coisas que já ouvi mas que parecem novas, tal é a lonjura a que estás de toda a normalidade.

Ter-te é como ter filhos, depois disto pode morrer-se de barriga cheia, com um sorriso de tanta superioridade que não poupará ninguém à inveja.

Apaixonares-te por mim é quase uma irresponsabilidade porque, entre outras coisas, és a mulher definitiva.

quinta-feira, junho 19, 2008

Precipitação.

Só quem já viu os esticões de uma corrente que prende um verdadeiro cão de guarda sabe do que falo. Não me podes olhar assim, aqui.

terça-feira, junho 17, 2008

Desafortunadamente.



Nunca poderei ocupar o lugar de quem tens na cabeça. É melhor habituares-te a mais, não que seja mais rico ou bonito, mas porque tenho muito mais vontade.

E isso que diferença faz? Toda. Mas talvez nunca me escolhas e prefiras passar os Domingos numa casa grande demais, com cheirinho a carne cara na cozinha. Com filhos vestidos com roupas que os teus pais nunca puderam pagar.

Se isso é ser feliz? É. Também.

Fotografia: Eric Traore

segunda-feira, junho 16, 2008

Anywhere I lay my head.



De vez em quando paro ao espelho e entretenho-me a olhar. Descubro o tempo e desconfio que é nos espelhos que ele pára. Na minha cara estão sempre coisas novas. Dantes demorava menos tempo, agora começo a parecer-me com um homem daqueles do cinema, com vincos, calma, testa grande e suspiros de mulheres que apreciam a maturidade em alguém para abraçar.

Mas cada vez paro menos, se calhar é por isso que tenho tanto em que reparar. E não - não contam as vezes que faço a barba.

Estou a precisar de férias ou de outro pouso para me ver com nova luz. Não há nada melhor que nos vermos num espelho estranho.

Podia até ser no do teu quarto, aposto que é lá que o tempo vive.

Fotografia: Eric Traore

quinta-feira, junho 12, 2008

Interlúdio.



Os primeiros sintomas não são sempre desprezíveis ou comuns. São coisas como a procura de contacto, como quem não quer, ou percebe, que é de propósito. Ah, esse pequeno encosto de braços ou ombros a meio de uma conversa, por entre a troca de sorrisos de quem conta uma palermice ou mostra uma fotografia do que já foi!

Tivesse eu a certeza que é de propósito e começava já a sofrer. O mais provável é não ser, ou não passar de mais uma coisa cá dentro, daquelas que já nem me lembro que existem.

Começar já a sofrer parece-me bem.

Por mera coincidência – dizes tu, por mera ruína – digo eu.

A sofrer é que eu me entendo com a tua imagem no meu peito. E até tenho inveja das varinas que não se envergonham de levar isto à letra, com aquelas medalhinhas de ouro e um amor esmaltado a sépia.

Fotografia: Eric Traore

segunda-feira, junho 09, 2008

Baby I’m just a fool.



Gosto do amor porque muda as pessoas. É ele, e nada mais, que as transforma naquilo que são.

Dá –lhes o atrevimento para pedir palavrões e desvia-as do marasmo. Leva a que tomem posições impensáveis até ali e deixa que outros as olhem como poucos. Às vezes trata putas como senhoras e senhoras como putas. Tem cheiro, sabor e delírio.

Que seja assim, encardido só à vista desarmada, porque senão é outra coisa qualquer.

Fotografia: Helmut Newton

terça-feira, junho 03, 2008

Dois.



Lembram-se do vídeo da miúda e do homem na mala do carro? Aqui está uma outra versão da música e do vídeo.

Tivesse eu acesso a um sistema de classificação Dubaiano e eram já sete estrelas para esta obra.

Kanye West – Flashing Lights.

quarta-feira, maio 28, 2008

Rubor.



- Lembras-te de olhar para mim e dizeres que estava todo encarnado?

- Lembro.

- Não estava cansado, estava com vergonha do tamanho da felicidade que sentia por te ver assim, nua.

Fotografia: Helmut Newton

terça-feira, maio 20, 2008

Chiroptera.



- Sabes o que é amorcegado?

- Não.

- É triste, taciturno, cabisbaixo, tristonho, sombrio...

- Pára! Pelo nome, pensei que era uma espécie de cegueira de amor.

- E é. Se reparares, é tudo sintomas disso.

Fotografia: Helmut Newton

quinta-feira, maio 15, 2008

Nascimento.



A primeira coisa a fazer, assim que se nasce, é chorar. Com ajuda de alguém ou sozinhos, quanto mais forte o fizermos, melhor será.

Não deixa de ser irónico ser esse o sinal de que estamos prontos e em conformidade.

Serve para afirmar a disposição e preparação para o que vier. O que for de extremos, dali para a frente, terá aquela marca.

Foi o princípio que calhou e não foi por acaso: há de ter muito uso se os anos correrem como se sabe.

Fotografia: Helmut Newton.

terça-feira, maio 13, 2008

História e vida: versão curta.

Rand Abdel-Qader, uma estudante iraquiana de dezassete anos apaixonou-se por Paul, um soldado inglês de vinte e dois. Aconteceu quando ela prestava apoio como voluntária a famílias desalojadas pela guerra.

Diz uma amiga que a coisa durou quatro semanas. Conversavam apenas e não aconteceu nada, tal era o respeito, o ardor ou a seriedade do evento.

O pai descobriu e matou-a com a ajuda de outros dois filhos.

Segundo a amiga, morreu virgem. Foi enterrada sem nenhuma espécie de cerimónia.

Versão longa aqui.

sexta-feira, maio 09, 2008

Nada.



Dava com ela a pensar no filho e nos filmes que se lembrava. Uma ilação sobrepunha-se: as fitas que corriam bem no princípio e no meio acabavam sempre mal. As que arregaçavam o drama no começo vinham a revelar-se com o tempo e encerravam bem.

O filho era novo, até agora a história dos dois era perfeita, se fosse um filme era mau presságio.

Mas os filmes são o que são e ela sempre foi tudo menos uma diva. Restava-lhe esperar e impor uma normalidade fora do comum. Uma tão grande que não prestasse para ser contada de qualquer forma.
Fotografia: Thierry Le Gouès

quarta-feira, abril 30, 2008

As vantagens da idade:

Sendo noite avançada, discutir com quem se ama não leva a lado nenhum.

Quanto maior é a raiva e a revolta, maior é o conforto da sua passagem para a desculpa das suas causas.

quinta-feira, abril 17, 2008

A década em que nasci.



Lá não havia SIDA, nem cintos de segurança no carro. O Elvis morria, as miúdas acabavam de queimar os soutiens em Paris. Haviam portugueses em África a morrer e matar como os homens devem fazer. Nada de ecografias, tudo em tacões coloridos. Viviam as colchas às cores e candeeiros em forma de disco voador. Eu vivi antes da convenção da meia turca.

terça-feira, abril 08, 2008

Chora.

Chora e espera que uma das lágrimas caia na areia que prende as pedras do passeio que corres. Levante e espalhe uns grãos em forma de coroa, poucos, que uma só não tem muita força.

Se alguém quiser, porque em Deus já não se acredita, há-de parecer um dos salpicos felizes do próximo Verão. Dos que estarão a uma eternidade deste empedrado, tão longe como este chumbo no peito quando lá chegares.

segunda-feira, março 31, 2008

She don't believe in shooting stars, but she believes in shoes and cars, (filme com bolinha encarnada no canto superior direito).



Flash Lights - Kanye West

É uma grande música, como tal, a história não pode acabar bem. Mas também hoje é segunda-feira e nada como aproveitar o início da semana para ver coisas menos felizes.

sexta-feira, março 28, 2008

Estranho Amor.



Apesar de amplamente divulgado, não resisto a mostrar aqui o clip que Sara Silverman fez para o namorado Jimmy Kimmel. Porque o Amor também pode ser bem-disposto e ter, digamos, capacidade de encaixe.

quarta-feira, março 19, 2008

Cicatrizes - segunda parte.



Passadas algumas semanas, quando as suas mãos já voltavam às de gente, a sua cabeça não largava a cara do homem que lhe queimara muito mais que a dignidade. Era como se aquele pensamento estivesse encurralado dentro dele, já quase em pânico, o pensamento, a tentar esconder-se ou falar de mansinho.

O regedor já era seu conhecido e o que acabara de acontecer podia muito bem ser obra daquele desgraçado. O homem vinha a cavalo, de repente apagou-se tudo: alguém lhe enfiara uma saca pela cabeça abaixo e chapara com ele no chão. No meio daquele sufoco de presa, começou a levar porrada. Lembra-se que, antes de desmaiar, ouvia o respirar já ofegante de quem lhe estava a enfardar tanto que julgou serem aqueles os seus derradeiros suspiros e dentes. Demorou meses a recuperar.

O irmão das laranjas nunca mais foi visto por ali. O tal regedor bem o procurou mas nada. Nem o resto da família, com a fome do costume, sabia para onde tinha ido.

Anos mais tarde, e desculpem-me a falta de cuidado com a manutenção do suspense, descobriram-no em Lisboa. No Campo Grande, tratava de uns cavalos e por ali fez família, matando, com o tempo, a fome e o passado.

Fotografia - Getty Images

quarta-feira, março 12, 2008

Cicatrizes.



Eram quatro irmãos e duas irmãs habituados com a fome. Naqueles anos a vida não era fácil e, em adultos, todos se lembravam do primeiro par de sapatos que provaram, tal foi o atraso com que lhes chegou.

Além da fome e do apelido com princípios de fama por más razões, pode dizer-se que os rapazes não eram flor que se cheirasse, no que ao trato diz respeito. Chegaram a roubar, mas sempre para comer. Entre favas e laranjas, qualquer coisa servia. Quando iam às favas, avisavam a mãe para pôr uma panela de água ao lume para as cozer assim que chegassem. A verdade é que muitas vezes, depois de descascadas, mal chegavam para todos, adiante.

Um dia o mais novo foi apanhar laranjas à quinta dos Palhas. À boquinha da noite, passou com cuidado no arame farpado do costume, só que desta vez estavam dois homens à sua espera.

Amarraram-no a uma árvore depois de lhe assentarem umas chapadas com muita força. Além de magríssimo, os dois juntos nem o deixaram falar antes do primeiro estalo. Seguiram-se insultos e alguns avisos para não voltar ali. O mais bera acendeu um cigarro e, apesar do outro lhe dizer que deixasse estar, queimou-lhe as pontas de todos os dedos.

Seguiram-se mais caneladas, gritos de piedade (que por acaso era o nome de umas das irmãs) e queimadelas nas mãos.

Quando o soltaram, levantou-se muito à pressa como uma marioneta ainda com cordas, virou-se para o do cigarro e, aos gritos e a chorar, disse que só ia ali porque precisava de comer, que as laranjas nem eram deles os dois e que ao dono não faria diferença que as levasse.

(Continua).

sexta-feira, março 07, 2008

Evidências.

- Quem é que sabe o que é melhor para ti?

- Tu.
Verdes anos.



de Carlos Paredes pelo Quinteto Belle Chase.

terça-feira, março 04, 2008

Cúmulos.



Não é a velhice, mas o cansaço que se aproxima. A secura e a poeira maceram-te devagarinho. Quando é que paras? Quando o fizeres é porque estás preparada ou dormente. Agora davas o que daria alguém condenado a uma cadeira de rodas, mas, como esse, sabes que isso não vale.

Procura erva alta e deita-te. Olha para as nuvens e repara, como dantes, nas figuras que elas fazem. Hás-de ver o que juntaste até hoje – nada que se aguente de pé.

Fotografia: Thierry Le Goués

terça-feira, fevereiro 26, 2008

Dá-me um Sol.



Se não fosse o que sou, afinava pianos. Para que pudessem chorar quando alguém lhes tocasse como tu me fizeste. Com papéis ou de ouvido, com mãos para cá e para lá, num vai e vem que até poderia parecer uma coisa qualquer de sexo, que não envergonhava ninguém.

Perdia o tempo que fosse preciso para que a força e a alma dos virtuosos lhes arrancasse bem a tal lamúria.

E o seu brilho lembraria o tempo que estavas de volta das unhas, a arranjá-las nem sei para quê, acabamentos sempre foi coisa que não precisaste.

Fotografia: Thierry Le Gouès

sexta-feira, fevereiro 22, 2008

Bom descanso. A semana que vem terá mais tempo que esta, pelo menos aqui para o Estranho Amor.



Bachelorette - bjork

quinta-feira, fevereiro 14, 2008

Durante horas.



Qualquer recreio de creche tem mais felicidade do que a que me sobra. Era capaz de estar a olhar para um como um velho para uma máquina a abrir fundações.

Com a paz com que se contempla uma lareira ou um recém-nascido a dormir.

Fotografia: Thierry Le Gouès

terça-feira, fevereiro 12, 2008

Coisas de homens.





No fim, o cobarde estava sentado à porta com um canivete e um pauzinho que ia descascando para se entreter.

Os dois tiros acertaram-lhe no peito. Com uma cara de espanto, e sem conseguir fazer doutra maneira, caiu, com a testa perto das botas empoeiradas de quem acabara de fazer justiça. Duas golfadas de sangue e de joelhos ficou.

Antes de sair, a mulher dissera-lhe para matar toda a gente menos as crianças. Ficou quase espantado por ela não ter desatado aos gritos e a pôr-se à frente com cantilenas de quem prevê desgraças. Se ela deixou, os do tribunal também haviam de perceber.

Agora a coisa estava feita. Não sabia se havia de esperar pela polícia ali ou em casa.

Fotografia: Thierry Le Gouès

sexta-feira, fevereiro 01, 2008

Bom fim-de-semana.



Let's Spend The Night Together - Rolling Stones em 1967

quinta-feira, janeiro 31, 2008

By appointment to her majesty, the Passion.



Esta coisa é tão forte como o gume de uma espada. Há posições em que não se vê, mas é afiada e mortal. Tão frágil, de um aço mole para que se amole na perfeição.

Experimentá-la só em naturezas mortas e em ocasiões especiais. Não se brinca com tal definição de final. Os cavaleiros nunca viram nada parecido de certeza. Nem os olhos das princesas que salvaram luziram assim.

Fotografia: Thierry Le Gouès

quarta-feira, janeiro 23, 2008


Tenho um coração novo.



Morning Sun – Edward Hopper

Vou limpar-lhe os salpicos de tinta, precisa de arejar por causa do cheiro. Sei que isto é coisa de se fazer com o tempo mais quente e com os dias maiores, mas a humidade não me assusta. Está com mais luz e até parece maior.

É incrível a quantidade de coisas que tinha aqui guardadas.

segunda-feira, janeiro 21, 2008

Uma viagem.



My Moon, My Men – Feist

O resto do albúm - The Reminder - tem o mesmo nível desta música e deste vídeo. Dos melhores de 2007.

quinta-feira, janeiro 17, 2008

Diferencial.



Havia de ligar-te porque desde que nos despedimos que estou a esforçar-me para não o fazer.

É assim fatal esta coisa, como o que me põe a pele com aquele ácido do fim do dia. Entranha-se como se tivesse unhas de mecânico, daquelas que não servem para te tocar.

Fotografia: Thierry Le Goués

sexta-feira, janeiro 11, 2008

Eu vi a luz.



- Li num livro que os doentes em coma, de qualquer idade, adoptam automaticamente a posição fetal e que só mudam se os enfermeiros forçarem outra postura.

- É terrível.

- O quê? O coma?

- Não. Pensar que alguém se intromete quando nos preparamos para nascer outra vez. Como quando te conheci. Agora, se abalasses, voltava logo para a barriga da minha mãe, apagado.

- Quando te conheci estavas de pé.

- Pois, foi alguma enfermeira que me preparou para te receber.

- Por isso tinhas a barba mal feita. Barbear alguém que está deitado é arriscado.

- É. Mas não se compara com o perigo de te perder.

Fotografia: Thierry Le Gouès

terça-feira, janeiro 08, 2008

Está lá?

Numa busca no telemóvel passo pelo nome de um amigo que morreu há dois anos.

Só agora reparei que ainda mantenho o seu contacto. Foi uma sensação estranhíssima (e eu costumo ter cuidado nos adjectivos, ainda por cima neste grau).

Parei sem saber se havia de apagar aquela linha agora privada de qualquer sentido. Depois decidi manter, sem explicação.

Qualquer dia ligo-lhe para ver o que dá. Só não foi hoje porque para estranha bastou a descoberta. E não me apetecia nada ouvir uma máquina dizer que ela, ele, eu ou quem quer que fosse, não estava disponível.

quinta-feira, janeiro 03, 2008

Lambazes.



Jane Russell

Há um homem que aperta a cabeça de um outro enquanto o esmurra sem lhe conseguir ver a face ou o lábio cansado. Tem um garfo de virar frangos espetado nas costas mas é como se não fosse nada. Um dos seus filhos está no chão e tenta dar caneladas no velho que o calca com a mesa de matraquilhos.

Os cães estão a ladrar, os miúdos a berrar e as mulheres a dar-lhes abana-moscas para os calar. Um dos que começou está sentado lá fora com um lenço ensopado e prepara-se para fugir assim que ouvir a polícia.

A rapariga devia ter ficado calada ou em casa. Vir para aqui não podia dar bom resultado uma vez que era família de alguém. Agora chora - a desgraçada, ainda há bocadinho estava a rir e a provocar.

O chão mistura a serradura e os cacos, cheira a aguardente e a panos de taberna.