quarta-feira, dezembro 27, 2006

Not bed.



Como o anunciado na imprensa, por €46.020 esta cama pode ser sua.

terça-feira, dezembro 26, 2006

Tristeza não tem fim, felicidade sim.

A minha felicidade está sonhando
Nos olhos da minha namorada
É como esta noite, passando, passando
Em busca da madrugada, fale baixo por favor
Pra que ela acorde alegre com o dia
Oferecendo beijos de amor

Vinícius e Tom Jobim

sexta-feira, dezembro 22, 2006

Os melhores presentes de 2006.

Estes blogs valem muito mais do que o seu peso em ouro e os autores deviam ser obrigados a escrever, pelo menos, três vezes ao dia:

- Estado Civil

- Voz do Deserto

- A causa foi modificada

- Bomba inteligente

Aos responsáveis, muito obrigado.

quarta-feira, dezembro 20, 2006

A tortura é manter-me calado.



Lido muito bem com as coisas que têm que ser, como as limitações da língua em relação aquilo que se quer dizer. Por exemplo, como se poderá dizer a uma mulher que se lhe adora o sinal que fica mesmo em cima daquele Tubérculo de Montgomery do mamilo esquerdo? Existirá uma forma romântica de o dizer? Talvez (por acaso pensei numa que seria uma saída airosa, mas não a revelarei).

Se fosse eu, dizia. Sou um boca de trapos. Eu sinto, tu ouves. O peito fez-se para isto.

P.S. Não encontrei nenhum link que aclarasse convenientemente o que eram os Tubérculos de Montgomery (pequenas glândulas salientes que cercam o mamilo), ou seja, esta explicação tornou-se também num caso comprometedor de falta de vocabulário.

Fotografia: Thierry Le Gouès

segunda-feira, dezembro 18, 2006

Hoje somos estes, amanhã seremos muitos menos.



Nick Cave

Não será bem um Gostar de Homens© mas sim uma espécie de terapia de grupo só com um participante. De vez em quando também preciso de visitar e perceber homens que vivem com a temática deste blog dentro deles. Necessidade de pertença ou inserção, estar por aqui sozinho é que não.

Preciso de ter provas de que isto não é uma conspiração, uma experiência química do meu centro de saúde ou os primórdios de uma doença com nome alemão.

sexta-feira, dezembro 15, 2006

Style It Takes.



John Cale e Lou Reed

Do magnífico álbum Songs for Drella, tributo dos dois a Handy Warhol.

quinta-feira, dezembro 14, 2006

Janela indiscreta.



Cala-te, ouve os vermes a roer. Olha agora os passos do padre. Vês, a tua cama é muito mais do que nós. Fica perto demais do mundo, isto está numa espécie de rés-do-chão da própria vida, já viste?

Daqui qualquer miúdo que passa consegue ouvir-nos até a sonhar.

E os olhos dos velhos? O que seremos nós nos olhos dos velhos amanhã de manhã?

Fotografia: Thierry Le Gouès
Duplo mortal.

Estou na dúvida entre escrever sobre o álbum Naked dos Talking Heads e o novo livro do José Saramago, As pequenas memórias.

segunda-feira, dezembro 11, 2006

Sinto frio.



O frio é menosprezado, sempre o foi. O Napoleão e o Hitler não lhe ligaram e já se sabe o que aconteceu. As suas tropas morreram e conservaram um sorriso que dizem dever-se a uma estranha sensação de calor que invade quem morre disso no último instante.

Não sei se ele me dá vontade de rir ou chorar cada vez que vejo num filme alguém a apagar-se nos braços de quem ama enquanto diz que sente frio.

Eu levo-o muito a sério e, apesar de saber que estou a pedir muito, gostava que ele não me enlouquecesse ainda mais quando te vir a despir a blusa.

quarta-feira, dezembro 06, 2006

Axioma.



A maioria das mulheres não é mais interessante porque não está para isso.

A maioria dos homens não é mais interessante porque não consegue.

Fotografia: Thierry Le Gouès

terça-feira, dezembro 05, 2006

In technicolor.



As obras-primas reconhecidas irritam-me como um familiar que fala demais. São sempre a tábua de salvação para quem quer mostrar que sabe ou viu coisas insuspeitas. São batota e não deveriam ser permitidas em jantares de amigos verdadeiros.

segunda-feira, dezembro 04, 2006

Punishing kiss.



- Bem tenho que desligar. Vou buscar a minha irmã e contar-lhe que a casa está neste estado porque em vez de arrumar e limpar tudo, estive aqui à conversa contigo.

- Não faz mal. diz-lhe isso que ela não se importa. Assim revê-me em cada meia espalhada no chão.

Fotografia: Thierry Le Gouès

quinta-feira, novembro 30, 2006

Wave of Mutilation.



Era uma vez um Deus daqueles capazes de controlar o mar que, por cinco ou dez mil dólares, matava de Nova Iorque até ao México. Pelo caminho deixava virgens numa ruína a clamar pela sua misericórdia ou pujança, sem saberem qual querer ou sofrer primeiro. E havia daquelas paisagens em que o calor reverbera, sabes?

Agora tu, inventa aí uma história que me ponha bem disposta.

Fotografia: Thierry Le Gouès
ONTEM PELA TARDE ENSOLARADA

Circulando através de Berlim a cidade morta
No regresso de um qualquer país estrangeiro
Senti pela primeira vez a necessidade
De ir desenterrar a minha mulher ao seu cemitério
Eu próprio deitei sobre ela duas pazadas cheias
E de ver o que dela ainda resta
Os ossos que nunca vi
De segurar o seu crânio na minha mão
E de imaginar o que era o seu rosto
Por detrás das máscaras que trazia
Através de Berlim a cidade morta e de outras cidades
No tempo em que estava vestido com a sua carne

Não cedi a esta necessidade
Por medo da polícia e dos comentários dos meus amigos.

Heiner Müller

quarta-feira, novembro 29, 2006

Heiner Müller



Admiro-o porque o horror de muitos dos seus textos aproxima-se da vida real e do quotidiano. São a loucura normal mas não aconselháveis a todas as susceptibilidades.


O PAI

Um pai morto teria sido talvez
Um melhor pai. O preferível
É um pai nado-morto.
Não pára de crescer a erva sobre a fronteira.
A erva deve ser arrancada
De novo e de novo que cresce sobre a fronteira.

Gostaria que o meu pai tivesse sido um tubarão
Que tivesse despedaçado quarenta baleeiros
(E no seu sangue eu teria aprendido a nadar)
Minha mãe uma baleia azul meu nome Lautréamont
Morto em Paris1871 desconhecido.

Heiner Müller
HIENA

A hiena gosta dos blindados imobilizados no deserto porque as suas tripulações estão mortas. Ela pode esperar. Ela espera até que mil e uma tempestades de areia tenham corroído o aço. Então chega a sua hora. A hiena é o animal heráldico das matemáticas. Ela sabe que não deve haver resto. Seu deus é o zero.

Heiner Müller

domingo, novembro 26, 2006

Fleuma.

Mijar contra o muro da escola ou atirar a sétima pedra ao ninho das andorinhas não é nada, quando se compara com a mais pequena das vergonhas adultas.
O Amor é mais fácil de aprender do que a descrição do Amor.

terça-feira, novembro 21, 2006

Como um choro de bebé:

o consolo é que não poderá durar para sempre.
Sangue azul.

Arrumo Blue Train de John Coltrane bem perto de Every Day dos The Cinematic Orchestra. Não gosto muito do primeiro e este leva-me sempre pelo braço para o segundo. Blue Train serve para manter o respeito dos amigos ou de quem vem cá a casa, o outro é o que me faz feliz a sério.

As aparências salvam alguns animais, entre eles inúmeros insectos.

segunda-feira, novembro 20, 2006

Já desconfiava.

Sou um fraco. Ainda não ter visto O sacrifício de Tarkovsky é só mais uma corroboração.

domingo, novembro 19, 2006

Pakistan?

O Governo paquistanês aprovou a lei que permite as mulheres apresentarem queixa por violação sem serem necessárias as quatro testemunhas do sexo masculino que anteriormente eram exigidas.

quinta-feira, novembro 16, 2006

Bombay Sapphire.



Depois de te perder consolam-me coisas como uns sapatos confortáveis ou umas calças passadas a ferro. Os velhos a tentar passar a rua também me deixam a alma tépida sem saber porquê. Se calhar é por ainda conseguir correr, mesmo sabendo que já não preciso. A eles também basta qualquer coisa que não doa os pés para se sentirem mais novos.

Acho que estou velho. Ouvi dizer que na Índia os velhos vão para sítios específicos morrer. Tenho um amigo que esteve lá e que viu um a passar, morto, levado pelo rio. Imagino-os num pátio solarengo e com cheiro a flores velhas, não é secas, é velhas, que é pior. Lá chegam com um saquinho, depois devem sentar-se à espera.

Já viste, a Índia tem estes pátios e tem o Kama Sutra. E o meu amigo disse que também há lá monumentos parecidos às nossas igrejas só que em vez de santos têm uma data de gente a fazer amor. Com as pernas, os seios e os sorrisos de pedra.

Se aqui tivesses dizia-te que a Índia é que era: consciência da morte e manuais para amar na perfeição.

terça-feira, novembro 14, 2006

Ao contrário.

Acho que a teimosia é uma das fundações de qualquer relação. A perseverança é demasiado fraca, planeada ou pomposa para que possa ser ligada à Paixão ou ao Amor. A teimosia é mais irracional e injustificada, por isso mesmo é a explicação mais próxima da verdade.

O Amor é um sinal de civilização sem filtro. Não se compadece com estudos ou convicções. Trabalha como um cilindro de alcatrão que alisa toda a verdade e mentira, espalmando-as numa massa uniforme que queremos e não queremos.

quinta-feira, novembro 09, 2006

Rise and fall.



She woolf daydreaming – Kid Loco.

O mundo é mesmo estranho. Ao procurar este tema no Youtube, deparo-me com este vídeo. A música é de amor, o vídeo é caseiro e o resultado final é fascinante.

Ele: Amas-me?
Ela: Tanto. Acho que vou explodir.

sexta-feira, novembro 03, 2006

Jus.



Já estou cansado de dizer que gosto de ti. Por mais que grite e sue, nunca vais entender este tamanho que me deixa sempre à sombra. Apaixonares-te por mim era o mínimo que podias ter feito. Pensando bem, nem havia outra maneira do próprio mundo lidar com esta coisa. É grande como um mar daninho, habituamo-nos a isto e depois nem reparamos. Quando menos se espera mastiga-nos e cospe no céu.

E nem com o tempo, vê bem, nem assim tu vais perceber. Já as veias me saltam, moles, das costas das mãos e ainda tu andas a rir e pedir-me dinheiro para o pão. Despe-te e faz jus aos livros que leste, aqueles só de letras que te ensinavam, dizias tu. Despe-te como uma qualquer vigarista que tenha morrido numa dessas histórias.

Fotografia: Thierry Le Gouès
Os direitos.

Não é a primeira vez que me alertam para o facto de alguém ter plagiado ideias e palavras deste e doutros blogs. Para quem nunca pensou vir a escrever, isto é uma espécie de elogio primário mas dispensável. Ainda para mais, parece que é gente que escreve livros e tudo.

Terei assim que arranjar sítio para arrumar o Reservados todos os direitos de autor. Aqui neste post nem fica mal, mas é pouco definitivo.

segunda-feira, outubro 30, 2006

Uma vida menos ordinária.



A puta ri-se o velho também. A música não é importante, nem o perfume barato nem os botões de punho em ouro que já tinha levado ao seu casamento. Nem a roupa comprada no chinês ou os saltos roídos pelo passeio têm importância. O velho é bonito para a idade, a mulher tem alguns quilos a mais mas até isso lhe dá uma certa graça ou prazer.

Há tabaco e álcool a mais, dentro e fora da coragem que mesmo agora vão usar.

Ela não escapa e ele não se importa de pagar por isso. Estão os dois convencidos que nenhum desconfia das suas verdadeiras razões. A puta e o velho estão felizes e tristes, cada um à maneira do outro.

Fotografia: Thierry Le Gouès

sexta-feira, outubro 20, 2006

Saída de cena.

Mais um morto nesta semana. Foi um primo meu que gastou o corpo em 45 anos. Excessos de tabaco, álcool e vontade de comer bem fizeram-lhe as vontades todos os dias até hoje. Vivia com os pais mas devia sentir-se só, nunca lhe vimos uma namorada, seria portanto homossexual ou abstinente como Kafka (não pelas mesmas razões deste, obviamente).

Tinha também uma veia de Keith Richards, o seu corpo, ou tubo de ensaio se preferirem, foi palco de cenas como: o peito a estalar com falta de ar e na mão direita segurava e utilizava a bomba da asma, enquanto na esquerda mantinha um cigarro aceso para fumar nos intervalos das bombadas.

No fim, os mortos saem sempre em ombros. Ainda bem que é assim.

quarta-feira, outubro 18, 2006

Ai a minha vida.



Descansa, com medo, agarrada à minha perna. Aviva as aparições cobardes que me visitam quando vais trabalhar. Sou uma desgraça, uma espécie de balhana embargada, incapaz de me levantar ou fazer um café. Só sei amar-te como nunca ninguém te quis. E tu sabes disso, ai se sabes, sabes tanto que me queres soldar a ti. E eu que nem mereço uma terroada na cabeça, quanto mais essa cúmulo de lágrimas e de céu plúmbeo.

Levanta-te mulher que não trouxe os comprimidos ou a faca capazes de me amaciar o peito. Vens tu falar de palmadinhas e de coisas com a boca. Queres matar-me?

E depois a coroa de flores, a quem é que pedirias emprestado para a pagar?

Fotografia: Thierry Le Gouès

sexta-feira, outubro 13, 2006

R.E.M.

De joelhos, vou matar-te aqui. Ensina-me a mexer com isto. O que é o cão? Aponta com o queixo. Tens os lábios a tremer. Não é um trabalho bonito, dizes tu? Então o que será? Se calhar pensavas que te deixava ir assim. O quê? Um sonho? Estou no teu sonho a atormentar-te com esta parvoíce? E tu sempre foste assim? Sempre percebeste a diferença entre o que sonhas e a realidade? Então fazemos assim, para isto não acabar já vou desamarrar-te e tu arrancas por ali a correr. Vais ver que quanto mais tentares correr, mais pregado ao chão vais ficar. É sempre assim nos sonhos.

Amanhã vamo-nos fartar de rir quando me contares isto. O que queres? Não podem ser sempre sonhos em que apareço nua.

quarta-feira, outubro 11, 2006

Dobro ou nada.

Nunca fui feliz, ou então sempre fui feliz a dobrar. Tenho uma mulher com o peito generoso e uma amante que nunca quis procurar melhor. Até tenho filhos das duas, dois da legal e uma da que nunca me conseguiu desencaminhar. Como eu, nunca percebi se foram felizes, se calhar não. Bem, tenham sido ou tenham esperado, chegou a hora. Restam-me poucos dias e preciso de me despedir. Terei uma para sorrir quando os paramédicos já estiverem cansados, agora da outra terei que me despedir antes, hoje talvez.

O meu neto leva-me lá, com vergonha, mas leva. Combinei que não abrirá o bico a não ser para quem quiser ou achar que deve. Paguei-lhe a carta, isto é o mínimo que lhe poderia pedir.

Este é um bocadinho da história dos últimos dias de um amigo que morreu na semana passada.

segunda-feira, outubro 09, 2006

Valsa.

Há um homem que já não tem idade para se alistar para a frente. Está triste e bebe como costume. Guarda o umbigo do filho numa caixinha, acha que era duns brincos que ofereceu à mulher aqui há uns anos. Está no bolso do casaco que ainda tem o forro em condições. Já lá foi com a mão muitas vezes, mais do que ao que tem a carteira. Tem saudades da mulher e do filho, das valsas, dos polícias e dos ladrões. Não sabe para onde vai mas espera ter tempo para guardar a caixinha muito mais tempo. O umbigo até é feio mas o seu antigo dono merece umas quantas orações. Lá está, não sabe rezar mas vai aprender com vontade.

E a vontade não lhe falta, a coragem sim. O seu problema sempre fora esse, quando tinha coragem faltava-lhe a vontade e quando se cansava de vontade nunca o deixavam falar.

Dessem-lhe uma espingarda e veriam como aquela conformação morderia. Ai o sabor a ferro! Esse odor e essa luz que entraria, se Deus quisesse, pela vida dos outros adentro.
A grande paródia.



Je t’aime moi non plus - Miss Kittin e Sven Vath

quarta-feira, outubro 04, 2006

Moléstia.

Em "Por quem os sinos dobram" de Ernest Hemingway existe uma grande paixão em que Robert Jordan trata Maria por adorada coelhinha. Tenho pena que assim seja, mesmo com a distância temporal descontada, adorada coelhinha ainda é uma expressão que me parece pouco apropriada.

O autor repete-a muitas vezes aquando do primeiro encontro carnal entre os dois. E o problema deve ser o patamar onde adorada coelhinha se encontra: nem é romântica nem suja o suficiente para ser utilizada por duas pessoas que se amam.

terça-feira, outubro 03, 2006

Sangue cigano. Eu sabia que estes nervos tinham que vir de algum lado.

O meu avô percebia muito de máquinas agrícolas e o meu bisavô chamava-se João da Ponte. Tinha este nome porque nasceu debaixo de uma ponte, parido por uma empregada da família Palha. Naquele dia ela e mais umas assustadas perceberam que a paixão pelo cigano fugidio chorava mesmo muito alto.

A minha mãe contou-me isto mas não me disse qual era o ofício ou especialidade do João da Ponte. Só disse que eram tempos difíceis e que o bisavô João mandou o Avô João estudar para Lisboa, coisa magnífica na altura.

segunda-feira, outubro 02, 2006

Everybody Hertz.



People in the city – AIR, live at the Mayan Theatre

Segunda-feira. Ontem deu chuva para hoje, como se uma segunda-feira pudesse dar outros ares que não estes. Cidades cheias, ruas escorregadias, carros de todas as cores com donos atrasados de todas as cores. Candeeiros de rua acesos, baralhados com a luz do dia ou da noite.

Vou fazer-me de morto, e voar por cima de toda a gente.

sexta-feira, setembro 29, 2006

Dor.



Junto uma dor às que tenho. Todos os dias há uma que se levanta e que vai comigo para todo o lado. Já me habituei a quase todas. Mas de vez em quando aparece uma nova. Parece uma velha curiosa a entrar numa igreja onde não é costume. Mesmo caladinha dá-se logo por ela.

Há dias em que a voluntária anda sossegada ou distraída como se andasse a ver montras.

Há outros em que chega uma das novas, às vezes depois do jantar, quando a cozinha já está quase varrida. Faz-me desarrumar tudo, pede coisas que já estão frias e ainda é capaz de se pôr a falar alto.

A de hoje foste tu que lhe disseste para vir. Ela não confessou mas eu sei que foste tu que deste com essa língua de seda nos dentes.

Fotografia: Thierry Le Gouès
Percebemos que o mundo é injusto quando:

Um amigo descobre uma música genial, que nos ajudou na adolescência, numa banda sonora de um filme da moda.

quinta-feira, setembro 21, 2006

Missão.

Paro e espero que esta espécie de morte, tal é a paz que aqui está, te deixe brincar com o meu suor. Gosto muito desta posição mesmo sabendo que é a que toda a gente imagina ser a dos pais quando estes - como dizê-lo? – fodem?

Mas o mais importante é o teu jogo post mortem, esperas que o meu suor escorra, manso, pela ponta do nariz e do queixo e tentas, não percebi bem ainda, apanhá-lo ou desviar-te. Só sei que ficas quieta, que sorris e que alguma coisa te encanta cada vez que cai uma gota.

Além do mais, nesta posição, entrelaças as pernas nas minhas e fazes força, como um filho às cavalitas numa feira.
Juan Rulfo.



Jorge Luis Borges admira-o profundamente. O pai de Gabriel Garcia Marquez disse-lhe para ler a obra deste mexicano se queria saber o que era o Realismo Fantástico.

É considerado um dos maiores nomes da história da literatura mundial.

A sua obra contém toda a violência dos dias e das vidas normais e eu gosto muito disso.

“San Juan Luvina. Aquele nome soava-me a nome de céu. Mas aquilo é o purgatório. Um lugar moribundo onde até os cães morreram e já não há nem quem ladre ao silêncio; pois assim que uma pessoa se acostuma ao vendaval que ali sopra, não se ouve se não o silêncio que há em todas as solidões.”

sexta-feira, setembro 15, 2006

Uma semana sem escrever e agora isto.



Roubaram-me o tempo. Parece uma mordaça. As mordaças às vezes dão para brincar.

Wolf Like Me - TV on the Radio

sexta-feira, setembro 08, 2006

Coisas que melhoram algumas vidas. ©

Mas como ao contrário dos bichos sabemos que temos de morrer, preparemo-nos para esse momento gozando a vida que nos é dada pelo acaso e por acaso.

Em A ilha do dia antes - Umberto Eco

quarta-feira, setembro 06, 2006

Tenho medo.

Que a sofreguidão me faça tropeçar com todas estas vontades nos braços. Não tenho idade, mas tenho medo à mesma.

Hei de começar a mirrar e quero ver onde tudo o que sinto vai caber.
Este blog é bem piroso e lamechas,



como o Amor deve ser. Verdadeiro.

Re-tratamento – Da Weasel

segunda-feira, setembro 04, 2006

Mãe, mãe, o meu amor nasceu.

À sombra. Com o peso que ninguém conseguirá tirar-me. Meu deus, mãe, como estou contente e pronta a levar por diante alguns dos teus conselhos. Arde-me o corpo, isso tu nunca disseste. Mas não te levo a mal, soubesse que era assim e muito antes o tinha cavado bem fundo onde fosse preciso. Mãe, conta-me, a roupa também te queimava?

Mãe, vou beijá-lo como sei. De certeza que vai perceber o meu gosto, mesmo que seja desajeitado. Estou tão feliz que já lhe perdoei metade da vida que me der.
Isto não é um post.



Brad Mehldau - Live in Tokyo. A música nº 6, cover de Paranoid Android dos Radiohead, com 19 minutos e meio. Ponto.

quinta-feira, agosto 31, 2006

No dia, se algum dia, te perder.

Não vou perceber porque hei de arranjar o canteiro. Vou riscar o meu nome sempre que o encontrar. Vou deixar estragar os dentes. Vou fazer festas ao vento que brinca na praia e que me enche o buraco que se internou na alma.

quarta-feira, agosto 30, 2006

- És tudo.

- Porquê?

- Vi uma estrela cadente e só agora é que me lembrei que podia ter pedido alguma coisa.
Vem aí o Outono.



Brevemente.

quarta-feira, agosto 23, 2006

De férias.

Tenho a vista cheia de coisas médias, fins de tarde com veleiros no horizonte, cervejas frescas, praias com areia boa, pessoas bonitas e feias a passear na areia molhada e sal nas costas antes de chegar à minha casa de poucos dias. As sensações são boas e não as trocava por nada, mas tenho pena que visualmente as férias sejam um bocadinho saloias. Servem para descansar e para percebermos como é interessante o resto do ano.

sexta-feira, agosto 18, 2006

Nem sei por onde começar.

Despejaste aqui uma data de dias, sorrisos, imagens e dedos na boca que se estão a acotovelar, encavalitar e a tentar passar à frente uns dos outros. Está lançada a confusão, já vi sapatos sem dono, caras encarniçadas e punhos desapertados. Daqui a nada ainda se aleijam, raios os partam. Parecem as cadelas de Povos, tanto querem os filhos que os acabam por matar.

Como se o mundo acabasse amanhã! Quanto tempo levarão até perceber que a vida se arruma um bocadinho todos os dias?

quarta-feira, agosto 09, 2006

O teu atraso.



É uma cruz no ponto que me borda as veias.

Fotografia: Thierry Le Gouès

quinta-feira, agosto 03, 2006

To hell whith small literature

We want something redblooded

E.E.Cummings, 1935

Deve haver preocupação com os adjectivos e com os advérbios. Tem que se estudar a arrumação das palavras muito bem e estender as frases e os parágrafos de forma convincente. Eu não sei, mas preocupo-me muito mais com ideias do que com técnicas. Admiro muito mais um escritor do que um professor. Acho até que quem sabe escrever bem acaba muitas vezes por ser como um treinador de atletismo, que apesar de ensinar a correr muito, corre pouco.

Isto a propósito de ter ouvido na rádio uma poetisa dizer que precisava de fazer uma paragem porque a sua obra estava a ficar muito correcta mas a perder a força.

Fortes são os conteúdos de histórias como aquela em que a minha mãe estava a comer um bolo de arroz e a falar com a Ermelinda Coveira enquanto esta esfregava uma caveira de uma velhota com uma escova e sabão num alguidar.

- Não te faz confusão estares a comer enquanto eu lavo os ossos da Bininha?

- Mais ou menos, a mim faz-me confusão é irmos todos para aí.

As palavras são só palavras, mesmo que se atropelem ou vistam à pressa de vez em quando. O que acartam é que conta.

Fotografia: Thierry Le Gouès

quarta-feira, agosto 02, 2006

Silly season.

As coisas por aqui estarão em banho-maria até ao final de Agosto. Virei cá de vez em quando mas sem compromissos como os Amores de Verão, esses ardilosos.

quinta-feira, julho 27, 2006

Balhana.

Não sei porque é que não sou alcoólico. Nem sequer suspeito porque é que não dei um bom fumador. Era tão fácil, o problema é que não acho graça beber sozinho e fumar de mais sempre me provocou coisas na boca e na garganta.


Mas percebo perfeitamente bem quem bebe e quem fuma sem manias ou freios. Quase que os admiro. Quer dizer, não tenho vergonha de beber só de vez em quando ou fumar apenas quando me apetece. Eu nem vergonha tenho de ter utilizado um adjectivo daquele tamanho no título do post anterior. E naquele grau.


Com esta idade começo a perceber que sou uma espécie de moldura de classe média. Limito-me a andar no pelotão e isso não me desagrada. A fama ou a morte seriam bem piores que isto.


Acho até que dava um bom anónimo numa das filas para as câmaras de gás, daqueles que inventavam afazeres de cabeça para não desatar a fugir pela lama. Coisas como procurar ver a mulher e as filhas do outro lado da rede, ainda que magras. Caso as tivesse, é claro.

terça-feira, julho 25, 2006

Triste, muito triste, mas lindíssimo.



Funeral - Band of Horses
Perda. Pedra.

Uma mulher ensopa do chão o sangue do filho com toalhas. Um homem sentia as pernas ainda há coisa de um minuto atrás. Um barco arranca sem esperar pelo último fuzileiro que, segundo parecia, ainda ia chegar. Apenas restavam três injecções e uma multidão de deitados. A porta do prédio já se abriu cinco ou seis vezes e nenhuma delas foi com a tua mão. Doze, treze vezes, vá.

segunda-feira, julho 24, 2006

Estranho calor.

Como se costuma dizer, este calor não tem ajudado nada à prática da escrita. Rápidas melhoras é o que prometo.

segunda-feira, julho 17, 2006

Pode-se aprender muito com as premissas de um ditador.

Nem tudo o que é bom é verdadeiramente bom, nem tudo o que é mau é verdadeiramente mau. Sendo assim, não só não matarei nenhum cavalo sem pensar, como nunca deixarei de perseguir qualquer coisa que me pareça pertencer. Tenho o coração escorregadio e uma baioneta que não vai para paciente.

sexta-feira, julho 14, 2006

Tinha tudo o que lhe pertencia ter.



Havia uma mulher que era perfeita. Não só da sua raça como de todas as vizinhas. Era tão perfeita que nem inveja provocava. Vestia-se com tudo menos exuberância e talvez por isso era preciso estarmos com atenção. Até as cicatrizes eram ornamentos da sua pele e da sua cor.

Os homens pareciam distraídos. Apenas um ou outro se matou sem que as famílias tivessem compreendido.

quarta-feira, julho 12, 2006

Rebellion (Lies).



Sleeping is giving in,
no matter what the time is.
Sleeping is giving in,
so lift those heavy eyelids.

People say that you'll die
faster than without water.
But we know it's just a lie,
scare your son, scare your daughter.

People say that your dreams
are the only things that save ya.
Come on baby in our dreams,
we can live our misbehavior.

Every time you close your eyes
Lies, lies!
Every time you close your eyes
Lies, lies!
Every time you close your eyes
Lies, lies!
Every time you close your eyes
Lies, lies!
Every time you close your eyes
Every time you close your eyes
Every time you close your eyes
Every time you close your eyes

People try and hide the night
underneath the covers.
People try and hide the light
underneath the covers.

Come on hide your lovers
underneath the covers,
come on hide your lovers
underneath the covers.

Hidin' from your brothers
underneath the covers,
come on hide your lovers
underneath the covers.

People say let's just die
faster than without water,
but we know it's just a lie,
scare your son, scare your daughter,
Scare your son, scare your daughter.
Scare your son, scare your daughter.

Now here's the sun, it's alright!
(Lies, lies!)
Now here's the moon, it's alright!
(Lies, lies!)
Now here's the sun, it's alright!
(Lies, lies!)
Now here's the moon it's alright
(Lies, lies!)

Every time you close your eyes
Lies, lies!
Every time you close your eyes
Lies, lies!
Every time you close your eyes
Lies, lies!
Every time you close your eyes
Lies, lies!

Every time you close your eyes

Every time you close your eyes

(Lies, lies!)

Arcade Fire – Funeral

Fotografia: Nobuyochi Araki

terça-feira, julho 11, 2006

Para que queres a verdade, se não a aguentas?



Seja o resultado de um tac ou uma conversa baseada em factos reais para além dos teus.

Fotografia: Thierry Le Gouès

quinta-feira, julho 06, 2006

Esmaguemos as nossas bocas, então.

(pensou ela sem a coragem que parecia a mesma de um puxão de gatilho)
Crime Scene.



Algum destes sorrisos foi o que lhe roubou a vontade de dormir? Veja bem antes de o identificar, eles vão virar-se, primeiro para um lado e depois contra si.

Fotografia: Thierry Le Gouès

terça-feira, julho 04, 2006

Complicadíssima ditadura.

Uma espécie de talha que redobra a alma e me doura os dedos. Vale mais do que a moldura de uma mãe argentina. Recolher obrigatório de todo o choro e vadiagem.

segunda-feira, julho 03, 2006

- Tenho medo.



- De quê?

- De ti.

- Se fosse a ti, também tinha.

Fotografia: Miles Aldrige

quinta-feira, junho 29, 2006

Simples.

Ele sentia uma corda no pescoço e o seu nó de mares que já afogaram demais. Ainda bem que a paixão não é tão visível como um capachinho.

As pessoas mais simples nunca retirarão a dor e o prazer possíveis dessa brutalidade. As suas relações, tal como elas, serão sempre uma prova de desperdício.

quarta-feira, junho 28, 2006

Ocupa o melhor lugar.

O meu avô ensinou-me a afiar uma faca:

Molha-se a pedra e passa-se a lâmina para cima e para baixo sem pressa. Um lado do gume quando vai acima, o outro lado quando vem para baixo. Depois da pedra de amolar, deve-se usar uma lixa de água, a mais fina que se encontrar. Molha-se a lixa, e passamos a lâmina, não só da mesma forma que na pedra, como também no sentido do corte, como se fossemos cortar a lixa mas com a lâmina quase paralela a esta, depois deste movimento a folha deve estar perfeita. Experimenta-se no polegar esquerdo: a faca está pronta se, sem qualquer pressão, lascar superficialmente a unha. Deve-se sempre avisar quem costuma usá-la.

Para saber se o aço é bom, bafejamos a lâmina e vemos o tempo que a humidade leva a desaparecer. Quanto mais rápido, melhor.

Tenho saudades de aprender. Ensina-me a dançar ou a ler.

terça-feira, junho 27, 2006

Faz-me um desenho.



Rascunho. Quero um rascunho, coisa feita à mão. Poupa-me a automatismos e a palermices eléctricas. Nada de truques ou sapateados.

Basta-me algo como um namorado novo. Como se fosse feito quando ainda nem são precisos preliminares. Lembra-te que no princípio até uma conversa faz suar.

sexta-feira, junho 23, 2006

Reza.



Tens a mesma mansidão dos que são demasiado novos para morrer. Doçura e sapiência são temperos raros, próprios da tua perfeição ainda inexperiente. O sono já te abandonou, era bom que a vergonha fosse a próxima. Pensas que um remédio te irá acalmar mas acho que desta vez nem um santo te valerá.

E o futuro que é tão estreito. Lá só cabe a honestidade das promessas que nunca serão feitas ou pagas. Será perfeito, portanto.

Fotografia: Miles Aldrige

quarta-feira, junho 21, 2006

Embora fingir que tínhamos uma vida?



Vou até à igreja, depois passo pelo campo e vejo o fim do jogo. Ainda deve dar tempo para ir até à leitaria e sentar-me cá fora a ver os velhos, as suecas e os sinais.

A vida é um conjunto de ficções sociais, como dizia o outro. Há dias em que preciso mesmo de perceber que errei as respostas todas. Por falar em citações revolucionárias, nunca me esquecerei daquela sem arranjo: Everything you know is wrong.

É por andar de olhos abertos e à pressa que preciso das mentiras lúcidas dos outros.

Fotografia: Sam Haskins

sexta-feira, junho 16, 2006

Johnny Walker.



Desculpa mas não me vou virar. Quero aproveitar este último tempo para guardar mais uns bocadinhos teus. Depois de nos despedirmos vou andar de costas, sempre virado para ti até dobrares a esquina.

Uma vez vi os alunos de um conservatório a fazer um exercício parecido com esta desgraça: andavam de costas, subiam ruas e tentavam adaptar as novas pernas a um passeio gasto.

Andar para trás? Claro que não, isso ninguém consegue fazer. E, caso fosse eu o primeiro a consegui-lo, isto não seria a nossa despedida.


Fotografia: Sam Haskins

terça-feira, junho 13, 2006

Modo de vida.

Aproveitar estes feriados para ler mais, alugar filmes importantes que se perderam no cinema e acima de tudo efectuar trabalhos de manutenção na casa e no carro.

I want to live like common people.
Do you want to sleep with common people like me?



Common People - Pulp

sexta-feira, junho 09, 2006

A primeira vez que forcei a linha dos teus dentes.



Estou num carro embriagado, num carrossel com parafusos a cair, num mar sem bandeira, num sonho, pendurado numa ponte com alguém a pisar-me os dedos, numa bateira virada, deitado num corredor de hospital, com lâmpadas fundidas, a ver marcas de unhas nas ombreiras, a cheirar o sal do meu próprio suor, a chorar, a querer correr sem poder, como no sonho lá de cima, mudo, de vida e de camisa, como quem muda de forças.

Fotografia: Sam Haskins

quarta-feira, junho 07, 2006

O último Landay.



Se dormes, só terás poeira
Eu pertenço aos que, por mim, não dormem a noite inteira

Fotografia: Thierry Le Gouès

terça-feira, junho 06, 2006

Se não tiveres feridas no meio do peito
Ficarei indiferente, mesmo que tenhas as costas esburacadas como um passador.

Os outros estão aqui:

Mais dois Landays.



Não haverá um só louco nesta aldeia?
As minhas calças cor de fogo ardem-me nas coxas

A minha boca é tua, devora-a, não receies nada
Ela não é de um açúcar que se dissolva


Fotografia: Thierry Le Gouès

segunda-feira, junho 05, 2006

Um primeiro Landay.



Ontem à noite estive com o meu amante: uma noite de amor que não se repetirá.
Como um guizo, com todas as minhas jóias,
tini em seus braços até ao fundo da noite.

Este e outros Landays irão aparecer por aqui. Landay significa “o breve” e é um poema popular curto composto por dois versos livres de nove e treze sílabas, sem rimas obrigatórias. É originário do Afeganistão e são as mulheres pashtun, escravizadas pela sua vivência que os criam. São uma espécie de gritos que comprometem tudo, principalmente os homens desta comunidade.

Fotografia: Zalmaï

quinta-feira, junho 01, 2006

Aparição.



Ah, és tu. Ainda bem que vieste. Já tinha saudades dos milagres que fazes nesta casa.

Fotografia: Thierry Le Gouès

terça-feira, maio 30, 2006

Obra prima.



All is full of Love - Bjork

segunda-feira, maio 29, 2006

Next.



Sabias que durante a noite e a ruína nem juízo tinha para ouvir as tuas perguntas?

Parecias a dona de um cão com saudades em demasia. Estava feliz mas a tentar perceber se me estavas a fazer festas ou a bater.

Uma vez torturado, torturado para sempre. Só me falta uma tatuagem no braço, daquelas com um número que me envergonhasse todos os dias à hora do banho.

Fotografia: Thierry Le Gouès
Entre vista.

Quando perguntaram ao actor Michael Caine porque aceitava fazer tantos filmes, de vários tipos e aparentemente sem critério de escolha este respondeu: tenho de aproveitar tudo antes que descubram que sou mau actor.

Cada vez que um grande blog faz referência ao Estranho Amor ou o coloca na sua lista de favoritos lembro-me desta resposta. Desta vez enganei o Berra Boi.

quinta-feira, maio 25, 2006

Video kill the Love star.



This is Love - PJ Harvey
Nothing last forever.



O desejo com temperatura de música africana adormece-lhe aos pés.

quarta-feira, maio 24, 2006

Devastação.



Comecei a ler História Natural da Destruição de W. G. Sebald, e no mesmo dia à noite o meu computador avariou. Perdi toda a informação que estava no disco rígido de forma inesperada e impiedosa. Nem os textos e imagens deste blog foram poupados.

Várias calamidades num só dia. Mas as do livro reduziram as outras a um misto de agradecimento e conformação.

Fotografia: Thierry Le Gouès

segunda-feira, maio 22, 2006

Folheada a cerejeira.



Mantém os lábios húmidos com a língua. Sabes que pelo andar da conversa é conveniente que assim fiquem. Daqui a pouco essa razão chega-te à boca.
Já eu preocupo-me com a nossa cama. Restam-me poucos anos e só penso em quem a aproveitará para a lareira.

As ralações têm a mesma diferença das idades. Pensas nesta noite como eu me espanto com o que estás aqui a fazer.

Fotografia: Thierry Le Gouès

sexta-feira, maio 19, 2006

Evidência.



- Podias ser um querido e ir buscar um copo de água à tua menina.

- Amas-me?

- Tanto.

- Como?

- Quando não estás fico assim com uma espécie de sede.

Fotografia: Thierry Le Gouès

quinta-feira, maio 18, 2006

THE END.

É coisa que não aparece na vida real. Ou pelo menos nunca sabemos se o monstro ainda se vai levantar quando voltarmos as costas.
Yes, I Can Can.



Ouvi dizer que as histórias de Amor não devem ser contadas com pessoas feias. Lost in Translation sem a Scarlett Johansson não seria a mesma coisa? Se Nickole Kidman e Ewan McGregor não actuassem no Moulin Rouge a magia seria menos fugaz?

Não sei.

Nos filmes, os heróis, tal como os amantes, parecem sempre demasiado bonitos.

quarta-feira, maio 17, 2006

Escrito no coração:



Proibido vazar sentimentos.

Fotografia: Thierry Le Gouès

terça-feira, maio 16, 2006

Culpa.



Depois da onda de suicídios que os desgostos do jovem Werther provocaram por toda a Europa, resta-me apenas lembrar que nenhuma mulher deve, em caso algum, limpar o pó a uma arma de fogo.

Não é importante o nome da personagem que mudou tanto o mundo real, mas, pelo sim, pelo não, chamava-se Carlota.

Fotografia: Man Ray

segunda-feira, maio 15, 2006

Ingratidão.



Ou as mulheres não são muito românticas, ou a actual tradução para português de Werther de Goethe, livro referência de todas as histórias de Amor e, quanto a mim, melhor que Romeu e Julieta, é uma porcaria desmesurada. Também se pode dar o caso de as mulheres, pura e simplesmente, serem ingratas. Claro está que nenhum destes dois enviesados comportamentos é grave ou sequer merecedor de observação.

À falta de uma boa conversa ou promessa interessante, aos homens basta-lhes o sexo. E é esta, e não outra, a grande vantagem destes.

Fotografia: Philippe Halsman

quinta-feira, maio 11, 2006

Africa Korps.



Fazia pontaria às dunas por brincadeira sem saber se aquilo era mesmo dele ou do calor. Se calhar quando fosse altura de disparar a sério desataria a tremer, os nervos, a malvada areia e mais os cabrões que o mandaram para aquele desterro. Aqueles três já não se podiam aturar e o careca andava sempre lá fora, qualquer dia ainda ficava a estrelar no próprio sangue, deserto. Há 4 dias à espera que venham os bifes, aquele tempo todo para perceber porque o mandaram para ali e nada, nem uma sombra. Aquele forno parecia um do inferno sempre que chegava o meio-dia.

E o careca lá fora a tentar fritar um ovo na caixa das ferramentas, isto só visto. Não imaginas o que nos passa pela cabeça. Não me posso encostar a nada que está tudo a escaldar, estou desconfiado que se me rebentarem o carro e ficar fechado cá dentro nem noto a diferença.

E tu? Tens ido ao jardim sozinha? Foste a Berlim tratar dos papéis do teu pai, eram para quê mesmo? Já dançaste com outro desde que me vim embora?

Promete-me que tens o mesmo cuidado com as saudades que eu tenho com as balas.
Fotografia: Thierry Le Gouès

terça-feira, maio 09, 2006

Descolonização.



- Sabe aquelas nódoas que ficam nos panos, e que, por mais que os lavemos, ficam sempre lá?

- Sei.

- O que acabei de lhe contar é uma dessas na minha vida.

Fotografia: Thierry Le Gouès
Não sei / não respondo.



Metade do que desejo serviria para me condenar há muitos anos atrás. A mim e a ti, que uma coisa destas é tudo menos obra deste mundo.

Nunca pensei que fosses tu a mandar-me para a fogueira.

Fotografia: Thierry Le Gouès

sexta-feira, maio 05, 2006

Luto.



Podia ter areia na boca, mangas molhadas, e dedos pegajosos, uma camisola encardida ou qualquer outra coisa que corroborasse esta falta de juízo, amiga de infância.

Não há um parente que diga dá um beijinho a esta senhora? Um que te obrigue a ferver numas poucas de lágrimas e que me salve desta viuvez?

Fotografia: Thierry Le Gouès

quinta-feira, maio 04, 2006

Contracção.



Preposição é uma palavra inflexiva que liga partes da oração, exprimindo as relações que elas têm entre si.

Proposição é uma palavra que está relacionada com o acto ou efeito de propor. Significa proposta ou oferecimento. Também é a parte do poema em que se indica o assunto de que se vai tratar.

A língua, a confusão, as leituras diversas. No fim, era o verbo.

Fotografia: Thierry Le Gouès

terça-feira, maio 02, 2006

Envelhecer.



Fiz anos neste fim-de-semana grande. Sem ter muito jeito com tesouras ou navalhas, recebi de presente esta cadeira de barbeiro. Sei que cumpriu bem a sua função durante décadas na Barbearia Raposo da Rua dos Correeiros. Esta e mais três foram as últimas a sair e a apagar a luz do nº 42.

Olho para ela e tento adivinhar que tipo de vidas passaram por ali para ficar mais bonitas. Escritores, marujos, velhos peneirentos, miudos mal ou bem criados, galãs de Domingo, comerciantes com peso a mais e uma ou outra sobrinha de um empregado.