quinta-feira, março 30, 2006

O meu pai.



Morreu em Agosto de 1995 com 47 anos por causa de um cancro. De vez em quando choro por ele e no fim pergunto-me como será quando chegar aos mesmos 47. É que uma coisa é recordá-lo ainda assim, mais velho como devem ser os pais, outra é, caso tenha essa sorte, chegar à idade com que morreu. Como é que vão ser os sonhos e as recordações a partir daí? Deixará de ser um mero pai para passar a ser um cúmplice maior ou um miúdo caso passem muitos anos? Nunca o vi como um garoto mas, se calhar, essa vai ser a única recompensa da maior injustiça que vivi.

Saber que não vou perceber muita coisa deixa-me tranquilo. Não fui eu que inventei a vida como ela é, e isso apazigua-me o estômago na hora de adormecer.

Fotografia: Nobuyochi Araki

quarta-feira, março 29, 2006

Hello Stranger.

Gosto de visitar sítios perto da perfeição.

Don’t stop loving me.
I can see it draining out of you.
It meant nothing.
If you love me, you’ll forgive me.

terça-feira, março 28, 2006

Rigor.



Calça aqueles sapatos que te estrangulam o fim da perna. Põe as meias de família rica mas de má fama. Sabes que ligo a isso do feminino e que sempre reparei nas diferenças do cabelo. Se há homem que honre essa vossa vontade de mudar só por só, sou eu. Não te esqueças desse perfume que mais parece uma trela que me vai prender às saudades de tudo isto.

Agora dança de forma a que quase sinta vergonha.

Fotografia: Akira Sakamoto

segunda-feira, março 27, 2006

Mea otra culpa.

Ao contrário do esperado, sempre que me atraso ou falho um dia, sinto-me como se falhasse com alguém e não com um blog. Isso não me impede de levar uma vida normal e é esse o problema.

sexta-feira, março 24, 2006

Fronteira.

- Cuidado, a cama ficou suja, aqui.

- Suja não, marcada. Não faz mal, deita-te aqui deste lado.

- Fico feliz por nada nos encardir.

Fotografia: Nobuyochi Araki

Amor ou muerte.

É mais fácil fazer uma revolução num país do que numa cabeça.

Fotografia: Nobuyochi Araki

quarta-feira, março 22, 2006

Maneiras.



Acordo os dias como quem abana um morto. Não pode ser mais fácil decidir que roupa vestir ou em que rua virar. As faltas ajudam-me a ser rápido e convicto como um bom mentiroso. Dão-me preguiça suficiente para parecer alguém longe do orgulho de uma mãe. Endireitar a gola ou dar mais alguns cabelos ao pente está longe de ser uma prioridade.

Assim, à primeira vista, pareço um desgovernado que dormiu à tua porta.

Fotografia: Eryk Fitkau

terça-feira, março 21, 2006

Não perdoa.

Aqui ninguém sabe para onde vai, sabemos que estamos perto mas não sabemos o tamanho dessa certeza. E a menina, vai passar a vir aqui mais vezes, ou é só mais uma daquelas que cá vem espreitar, ganha pena, e depois acobarda-se na sua idade?

Ri-se de quem é velho porque tem esperança de nunca aqui chegar, se tiver azar talvez morra nova e dê um bom cadáver. Senão, já sabe o que a espera. Isto se tiver sorte, claro está.

Você é linda. Por aqui não passa de um bocado de mau caminho.

Fotografia: David Sims

segunda-feira, março 20, 2006

Com os dias cheios de cores frias e más caras.

Sou um destroço que poderia servir para te agarrares. Não queres essa corrente como companheira, pois não?

sexta-feira, março 17, 2006

É aqui que me sinto fraca e com vontade de conversar.



O que levará uma mulher a escrever isto numa parede?

quinta-feira, março 16, 2006

Desculpa-me o atrevimento.



Podia ficar aqui horas a tentar dizer-te coisas que não seriam bem a verdade. Chocar-te com revelações de pechisbeque. Ganhar tempo para te imaginar nua.

Podia ficar aqui a fazer Amor contigo, não era nada de mais. Menos para nós.

O nosso cataclismo não mudaria nada no mundo.

Fotografia: Wing Shya – 2046 – Wong Kar-Wai, 2004

quarta-feira, março 15, 2006

El Diablo en el Ojo.



Só me apetece fazer coisas óbvias como beijar-te ou ficar sem fome. Já guardei o guardanapo com a marca do teu batom.

Estes cálices eram da minha avó, o vinho não. Bebe pela garrafa, mostra-me a blusa, sorri e conta-me a história dessa cicatriz que tens no joelho. Vou levantar a música e as gargalhadas. Nada te faz mais bonita que os nervos na voz.

O perfume da carne e o teu não me deixam arrumar o que preciso. Posso amanhar um disfarce ou uma conversa, mas não o teu peito.

terça-feira, março 14, 2006

Isto é o que eu digo,



se soubesses o que eu penso.

Fotografia: Fa yeung nin wa (In the mood for love), Wong Kar-Wai - 2000
Data de crescimento.



Há dias em que nada me parece novo. A vida limita-se a ir rebocada pelo Sol e a paz já sei que vai chegar tarde, como de costume.

São dias em que as melhores coisas aconteceram na minha cabeça. Ainda assim, sou um privilegiado.

Não querer ser rico dá-me uma grande margem de manobra no que a sorrisos diz respeito.

Ando a pensar em mudar de peso e em deitar-me mais cedo. Adoro a idade e invejo a da minha mãe, que diz já ter uma que lhe permite escolher quem atura.

sexta-feira, março 10, 2006

Obrigado:

Porque eu também senti o pranto dela dentro de mim como se estivesse espremendo o trapo dos nossos pecados.

Em: A planície em chamas - Juan Rulfo
Um suspiro por:



- tocar um dedo que não é teu na campainha;
- abrir a caixa do correio vazia;
- dançar sempre com outra;
- cada colher de açúcar demasiado cheia;

Fotografia: Wing Shya – 2046 – Wong Kar-Wai, 2004

quarta-feira, março 08, 2006

A vida foi-se embora antes da morte chegar.

Tenho um amigo que é velho e que está doente. Quando era novo teve dinheiro, filhos uma mulher dedicada e uma amante de quem também teve filhos. Foi inteligente e portanto um pouco distante das pessoas, da sociedade e de algumas normas.

Trabalhou sempre em demasia, foi roubado e tinha um medo gigante de andar de avião. Agora está em casa à espera que o chamem do hospital para ir lá deixar metade de uma perna. Problemas de circulação e outros ainda mais graves não o deixam sossegar.

No intervalo das lágrimas às escondidas deve lembrar-se do almoço que, aqui há uns anos, preparou para uns amigos, onde o Eusébio também estava.

terça-feira, março 07, 2006

Medo do escuro.



Deitar-me cedo, para que as palavras que faltam de dia me completem de noite.

Fotografia: Wing Shya – 2046 – Wong Kar-Wai, 2004

segunda-feira, março 06, 2006

Carga máxima.



Que barulho fazem as chaves na tua mão? É o eco da tua vida a subir ou o preço da tua beleza a descer o que ouço nestas escadas? Fechaste bem a porta?

Tens novas palavras de elevador para o caso de aparecer alguém? Não. Claro que não tens, tu não precisas, és mulher e isso de falar do tempo em elevadores é coisa típica de homens. Aprendeste depressa demais a não responder a estranhos como eu.

Fosse alguém normal e já tinha, com esta idade, apanhado um estalo por causa dum beijo mais do que justificado. Seria para aí entre o 3º e o 7º andar, longe da descolagem e da boa tarde ao mesmo tempo.

Fotografia: Wing Shya – 2046 – Wong Kar-Wai, 2004

quinta-feira, março 02, 2006

Checkpoint.



Não sei o que é este blog. Não sei se é bom ou se não é grande coisa. Às vezes acho que é foleiro. Outras engraçado. De vez em quando parece-me demasiado lamechas ou dramático. Há textos interessantes mas há outros que nem por isso. E também há coisas mal escritas, nem vos digo nada. Nem sei onde é que estava quando mostrei tais avantesmas.

A única coisa que me salva é saber que nunca tive grandes pretensões. Não só não acredito em escritores tão novos como eu, como não respeito nenhuma regra que diga respeito exclusivamente aos blogs. Os links aqui ao lado só lá estão porque gosto sinceramente destes blogs, o que não significa que não aprecie tanto ou mais outros que por relaxe ainda não estão lá.

Tenho cada vez mais leitores e cada vez mais referências. Já fui linkado pelos blogs que mais respeito e elogiado quase sempre de forma injusta ou inocente.

Sei, desde o princípio, que isto de escrever sobre Amor é como andar sobre gelo fino.

Bem, seja bom ou mau, está na hora de continuar tal e qual como está.

quarta-feira, março 01, 2006

Cercado 5.1



Há coisas que não são para apanhar. Delas se deve atravessar para o outro lado da rua, virar a cara e fingir que não se conhecem. A bem de qualquer juízo, abandonemos o que nos ultrapassa. A vida ou o tempo irão varrer isto e apertar a mão dos embriagados.

Conheço demasiado bem o chão. Tão bem que às vezes não sei se já me levantei ou se continuo aqui agarrado à maçaneta do teu quarto.

Como dizem nos filmes, o Amor é um sítio estranho.

Fotografia: Mulholland Drive, David Lynch – 2001